Lia falava com Nina mas sem deixar de a observar, o que a deixava desconfortável. Pensou sair dali, mas para onde?! Não conhecia ninguém.
- Lia, scusa!
Um jovem chamou a atenção de Lia, que se desculpou antes de as deixar a sós. Su agradeceu a intromissão, o olhar persistente, embora disfarçado de Lia incomodava-a.
- É uma jovem encantadora. - Nina tinha os olhos brilhantes de orgulho. - Não teve uma vida fácil, mas conseguiu o que queria.
- É, a vida não é fácil. Parece simpática.
- E é, muito mesmo. Como se conheceram?
- Como ela disse, cruzámos-nos brevemente. - Su não queria entrar em detalhes - Estava para se casar, já casou?
- Ainda não, casam na primavera.
- O noivo. Está cá? - O coração batia tão apressado que podia ouvi-lo dentro da sua cabeça.
- O noivo?! Oh não! Está em viagem. - Su respirou de alivio, não corria o risco de o encontrar - Os pais dela não aprovam. Sabes como é, quando se tem raízes humildes, é difícil ser aceite neste meio.
- Imagino. - Lembrou-se que Michel foi criado longe do pai e de toda esta opulência, cresceu com a mãe, que era apenas uma empregada.
- Mas ela venceu. Amam-se. Basta vê-los juntos para se perceber. Sempre lhe dei o meu apoio, muitas vezes encontravam-se na minha casa. Sabes, eu fui ama da menina Lia, o meu marido foi advogado da família dela. Daí a amizade, embora já não trabalhe para eles ainda se mantém uma certa amizade.
- Certas coisas ficam sempre. - Su imaginava os dois sentados no sofá da sala de Nina, beijando-se. Por uns instantes sentiu as lágrimas chegarem-lhe aos olhos. Mas Nina chamou a sua atenção.
- Ali está outra pessoa que queria que conhecesses.
Quando Su olhou na direcção que ela indicava, as pernas desfaleceram e sentou-se pesadamente. Não por ter visto Michel, mas por ver que era seguido pelo seu homónimo, de mão dada com a filha nos seus pequenos passinhos. Mas depressa se recompôs, Michel detestava dar nas vistas, não faria nada que coloca-se a sua presença em evidência.
- Michel! Que prazer ver-te!
- Nina. - Michel abraçou Nina, mas não desviou o olhar do dela. - O prazer é todo meu.
- Queria apresentar-te...
- Não é preciso Nina. Já nos... - Michel calou-se ao ver o pequeno ser, que se agarrava ás pernas dela, a sua expressão passou por várias emoções - Vens comigo. E nem tentes inventar uma desculpa. Lia onde...
- No andar de cima. Podes usar o escritório.
- Obrigada. Vamos?! - Michel fez sinal para ela ir à sua frente. - Nina, importas-te de olhar pela pequena?
Perante o olhar incrédulo de Nina e do marido começou a andar. As pernas tremiam-lhe e o coração batia fortemente. A sua cabeça começava a latejar, malditas enxaquecas... chegavam sempre que tinha uma crise de nervos! E esta era uma dessas situações.
Michel colocou-se ao seu lado, mas não disse nada. Agarrou-lhe o braço quando ela passou a porta do escritório, uma corrente eléctrica percorreu o seu corpo ao toque dele. Abriu a porta e deixou-a entrar.
- Porquê?! Podes ao menos dizer porquê?!
- Porquê, o quê?! - Parecia uma conversa de parvos. - Não te estou a entender.
- Não?! Então vou simplificar... Porque desapareceste?! Porque me escondeste que tenho uma filha?! Porque não vais negar que é minha!
- Não!
- Meu Deus! - Ele passou as mãos pelo cabelo - Sempre foste complicada, e gostas de complicar as coisas mais simples. Porquê?! Diz-me!
- Porque... - Que dizia?! Que o amava, embora ele fosse casar com Lia?! Que partiu porque não podia vê-lo com outra mulher?! Porque se ficasse morria de desgosto?! Que partiu para ele não se sentir obrigada a nada?! Que conseguiu manter segredo sobre o pai da filha?! Que só havia quatro pessoas no mundo que sabiam que ele era pai?! Que não queria nada dele?! Isso! Era isso. O dinheiro, os ricos não gostam de perder o seu dinheiro. - Porque o facto de seres o pai não altera nada.
- Como não?! - Olhou-a furioso.
- Sempre quis ser mãe.
- Não me vais dizer que fui um meio de chegar a um fim. - A irritação dele era evidente.
- Muitas vezes fazemos coisas sem pensar para alcançar o que queremos, e como sabes as coisas não correram bem na primeira vez, apenas... - Ele agarrou-lhe o braço e sacudiu-a - Estás a magoar-me!
- E vou fazer muito mais, se vais fazer esse papel de mulherzinha sem escrúpulos. Conheço-te, não inventes! Quero a verdade. Diz-me!
- E quem te deu o direito de exigir a verdade?! - Os olhos brilhavam de raiva e de desespero - Acaso tu foste sincero?! Não! Caterine é tua filha sim, vai fazer um ano. Como pudeste ver, não há como negar que é tua filha. Se te preocupa a presença masculina na vida dela, não penso arranjar um homem para te substituir, posso educa-la sozinha. Posso deixar isso por escrito se quiseres. Não quero nada teu, podes casar descansado que não te vou exigir...
Michel largou-lhe o braço para a agarrar pela cintura e puxa-la para junto dele. Olhou-a nos olhos brilhantes.
- Acho bem que não me substituas, não ia gostar.
Michel acariciava a sua nuca, deixando-a sem forças para lutar. Não conseguia pensar quando ele a acariciava assim. Tinha de o afastar, tinha de se focar no casamento.
- Importas-te de me soltar?! A tua noiva não ia gostar, de saber que tens estas intimidades com outra mulher.
- A minha noiva... Acho que já te disse que és complicada, muito complicada. - Beijou-a - Mas mesmo assim, amo-te! Não sei porquê, isso ainda é um mistério para mim. - Voltou a beijá-la - Onde foste buscar a ideia que vou casar?!
- Não vais?! - Su olhava surpreendida para ele - E amas-me?!
- Não e sim.
Lágrimas descontroladas caiam no seu peito, olhou-o nos olhos e sentiu que ele dizia a verdade, as lágrimas aumentaram de intensidade, parecia que o peso que carregou neste tempo lhe foi retirado dos ombros.
- Pensei que fosses casar com Lia.
- Com Lia?! Somos amigos, nada mais.
- Ela disse que eram noivos... - O seu olhar entristeceu-se.
- Isso! - Viu sorrir - Podemos deixar isso para depois?! Acho que lá em baixo, há pessoas que devem de estar a imaginar que nos estamos a matar. E não merecem que as privemos da festa de Lia.
- Não gostas mesmo de falar de ti.
- Tens razão, não gosto. Tenho os meus motivos, mas prometo contar-tos. Hoje à noite, quando estiveres nos meus braços. - Ela corou e ele deu-lhe um beijo mais apaixonado - Agora quero conhecer a minha filha.
- Desculpa. Não queria afastar-te dela. Eu não podia ficar ali, e arruinar o teu casamento. Só soube que estava gravida em França. Desculpa!
- Em França?! Realmente temos muito que falar! Penso que com a chegada do nosso terceiro filho...
- Terceiro?! - Su sorriu - Por falar nisso, Timy, como está?
- Bem, está enorme. Pergunta pela mãe todos os dias.
- Não devias de o incentivar.
- Porque não?! Penso casar-me contigo! - Beijou-a antes de abrir a porta do escritório - Vai ficar feliz de te ver.
- Eu também, tive tantas saudades.
A meio do corredor parou-a e envolveu-a nos seus braços antes de a beijar. Um jovem que passava de mão dada com outra jovem, assobiou e deu uma palmada nas costas de Michel, o que fez com que recordassem onde estavam.
- Promete que não voltas a desaparecer. - O olhar dele escureceu ainda mais - Não saberia que fazer.
- Não?! - Sorriu ao imaginar aquele homem forte, a sentir-se desorientado sem a presença dela.
- Quase enlouqueci tentando encontrar-te. Acho que o melhor é não te soltar.
- Acho que vais precisar dos dois braços, para agarrares a tua filha.
- Feitozinho da mãe?!
- Não, temperamento do pai.
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