sábado, 25 de junho de 2016

ACASO DO DESTINO 8ª PARTE


Quando, nessa noite, falou com Ana por video conferência inventou uma enxaqueca horrorosa para justificar a má cara que tinha. Desculpa que Ana fingiu aceitar.
 Nos dias seguintes teve de fazer um esforço enorme para brincar com Rita, ainda faltava mais de uma semana para as férias. Depois, Fernando ia levar Rita, para passar as férias com os avós.  
Já tinha tudo pensado, nessa altura ia passar uns dias longe dele, falou com uma amiga que alugava cabanas rústicas na montanha, precisava de pensar. Ficar ali, onde ele a podia influenciar, não a ajudava a tomar uma decisão ponderada.  Pagou a cabana por adiantado e limitou-se a esperar que os dias passassem.

Na segunda semana de Dezembro, a directora da escola de Rita telefonou a anunciar que a professora estava com gripe, e como as férias estavam quase a chegar, não se justificava estar a pedir um professor substituto, professor esse, que possivelmente, só chegava na semana de férias.  Tendo isso em conta, a direcção decidiu, que as crianças do primeiro ano entrariam de férias uma semana mais cedo. Pediram desculpa por qualquer inconveniente e prometeram acertar a parte económica no trimestre seguinte.

Fernando decidiu levar Rita mais cedo para casa dos pais. O que deixou a menina num estado de excitação enorme. Na noite anterior à partida mal dormiu. Enquanto ela arrumava as roupas para a viagem, Rita falou sem parar dos planos para os dias que ia passar com os avós.
Na hora da partida, a menina abraçou-a com tanto carinho, que pensou que se ia abaixo.  
- Vou ter muitas saudades. - Dizia a pequena ao mesmo tempo que a abraçava.
- Eu também minha linda. -Um nó fez-se na garganta dela ameaçando transformar-se em lágrimas.
- Vou telefonar todos os dias, prometo. - E levou a mãozinha ao coração.
- Vamos lá, até parece que nunca mais se vão ver. - Fernando agarrou a mão da filha e ajudou-a a subir no carro.
Mal o carro desapareceu ao fundo da herdade as lágrimas começaram a cair. Limpou-as com a costa da mão. Tinha de seguir com o que tinha planeado.
Deixou uma carta a Fernando explicando que tirou estes dias, que Rita não estava, para pensar. Esperava que ele compreendesse, e que se ele quisesse podia processá-la. Se assim o decidisse ela entenderia, visto estar a quebrar o contrato, mas não podia continuar assim. Quando tivesse decidido que ia fazer, logo lhe faria chegar a decisão.  Telefonou a Dona Joana para explicar que ia ficar uns dias afastada por motivos familiares, prometeu estar de volta tão rápido quanto possível, deixou-lhe as tarefas diariamente agendadas, e embora contrariada, acabou por concordar em fazer a cama dele e limpar o que fosse necessário. Mas deixou bem claro que não ia cozinhar!
Depois de avisar Filipa da sua decisão,que a achou louca, por se meter num sítio onde não havia rede de telemóvel, nem internet , foi para casa arranjar a roupa para levar. Falou com a filha mais uma vez mas não lhe disse o que se passava. Quando apanhou a mala de viagem, a aliança brilhou no seu dedo,  olhou-a por uns instantes. Tirou-a do dedo e colocou-a na caixa, junto com a do falecido marido. Achou hipócrita usar o símbolo dum sentimento que não existia mais. Colocou no dedo uma anel que tinha pertencido à mãe. Era simples, tinha apenas uma pedra vermelha incrustada. Mas ela gostava dele. Fechou a porta e partiu, rumo à solidão da imposta.

Duas horas depois, avistou a pequena povoação que servia de centro de abastecimento, às cabanas que existiam pela encosta da montanha. Comprou tudo o que achou necessário e deixou o carro num edifício, que tinha como único propósito, servir de garagem para as viaturas dos inquilinos que habitavam ocasionalmente as cabanas.
Com os sacos na mão, subiu a encosta. Depois de caminhar, mais de meia hora por entre arbustos, árvores e terreno lamacento, encontrou a cabana. Assim que entrou, o cheiro a madeira encheu-lhe os sentidos. Notava-se que tinha sido limpa à pouco tempo. A lareira estava preparada para ser acendida. Colocou os sacos na mesa da sala e foi conhecer os aposentos. A sala era composta por um sofá de dois lugares,em tecido. Nas costas deste, uma manta de lã cuidadosamente dobrada. Uma mesa pequena continha algumas revistas. Uma estante com alguns livros, um candeeiro alto, uma televisão e dois quadros era tudo o que existia na sala. A cozinha era simples, a bancada de pedra com o lava loiça, uma mesa de madeira com quatro cadeira, um frigorífico pequeno e o fogão. Num canto uma salamandra que também estava cheia de lenha pronta a arder se assim o quisesse. A casa de banho, embora não fosse de luxo, tinha mais que o indispensável para a higiene. Os quartos, um de casal com uma cama enorme de madeira castanha e um roupeiro, assim como um aparador com um espelho. Uma arca de madeira trabalhada, colocada aos pés da cama completava o conjunto. O outro quarto era composto de duas camas com uma mesinha ao meio onde estava um candeeiro e um roupeiro mais pequeno que o do outro quarto. Um quadro decorava a habitação. Embora todas as divisões tivessem janelas o imenso arvoredo mantinha a casa sob uma confortável penumbra. Junto à cozinha uma casa com acesso às traseiras, continha uns baldes, cordas, numa prateleira um candeeiro a petróleo, uma caixa de velas, no chão por baixo da prateleira, havia lenha e numa casa ao lado, mas mais pequena ,um gerador, que abastecia a casa de electricidade, esse era o único luxo que tinha para lhe fazer lembrar a civilização. Voltou para a cozinha. Arrumou as compras e a pouca roupa que tinha levado se sentou-se a aproveitar o sossego. Amanhã tinha tempo de pensar no que fazer da sua vida. A solidão sempre foi boa conselheira. Trocou os sapatos por botas e saiu para conhecer o espaço que a rodeava.
O som de água a correr levou-a a subir um pouco. A subida não se mostrou fácil, devido à chuva, escorregava bastante, mas valeu a pena!

O riacho caía em cascata, num lago ao fundo. Pedras dispostas de forma desorganizada, davam forma ao curso de água . Árvores verdejantes salpicavam o terreno junto ao riacho, estendendo-se ao resto do local. Sentou-se numa pedra e deixou-se ficar a olhar a água que corria livremente, o som da água transmitia-lhe serenidade, respirava-se paz... Um casal acenou-lhe lá de baixo. Sentiu que tomara a decisão certa ao ir para ali.

Com uma chávena de café nas mãos e sentada em frente à lareira, pensava na atitude que tomou. Fugiu, como uma cobarde, tinha plena consciência disso. Mas também tinha consciência que se ficasse, deixava-se envolver por ele. Não tinha forças para lhe resistir. Amava-o, tudo o mais era secundário. Quando estava com ele esquecia o resto do mundo, até os valores que tentou transmitir à filha, pareciam não ter assim tanta importância. Nos braços dele sentia-se mulher, os beijos faziam-na suspirar por mais, as caricias levavam-na à loucura. Mesmo longe dele, podia sentir o cheiro dele, as suas mãos percorrendo o corpo dela...
Levantou-se furiosa consigo mesma, a ideia de estar sozinha era pensar em encontrar uma solução. Não sonhar com ele!
Tinha de ser objectiva. Ele voltou atrás no divorcio, isso era ponto assente. Por muito que a beija-se e a deseja-se, Ju era a mulher que amava. A mulher que conseguia com um simples pedido de desculpa, por muito falso que fosse, fazer com que ele a aceita-se de volta. Ele não conseguia afastar-se dela, apesar da traição, de tratar mal a filha de ambos. E por muito que ela o amasse e amasse Rita, sabia que o seu coração não ia aguentar vê-lo com Ju diariamente.

A decisão parecia estar tomada quando se deitou, mas a noite foi má companheira e trouxe-lhe as recordações das mãos dele, dos beijos, do corpo dele junto ao seu. Acordou afogueada. Castigou o corpo, com uma caminhada na madrugada gelada. Quando voltou, tinha o rosto vermelho do frio e estava gelada. Como não deixou a lareira acesa a sala estava um gelo. Acendeu-a a custo, pois tinha as mãos geladas, e meteu-se no chuveiro. A água quente a tocar no seu corpo, pareciam agulhas a furarem-lhe a pele, mas depois começou a sentir o corpo gelado aquecer. Nessa manhã, deixou-se ficar sentada frente à lareira, a ler um livro que tirou da estante. Envolveu-se na manta e deixou-se envolver pelo romance, quando terminou, a manta estava húmida pelas lágrimas que caiam. Chorou, pelos protagonistas e por ela até adormecer.
Acordou ao som da chuva que caía lá fora, meteu mais madeira na lareira e foi espreitar a chuva. O cheiro a terra molhada e a erva fresca enchia o ar. Adorou o cheiro, puxou uma cadeira para o alpendre. Faz um chá bem quente, e sentou-se a ver a chuva cair. Sabia bem estar ali, onde tudo parecia estar bem. Ao certo, não soube o tempo que esteve ali, a olhar o infinito, com a mente em branco. Voltou para dentro quando o frio a chamou à razão. Comeu o resto do esparguete do almoço e viu televisão até altas horas. Os seus pensamentos voavam para ele mal ela se distraía, não queria pensar nele mas o seu subconsciente não pensava da mesma forma. Um barulho na porta distraiu-a. Devia de ser o vento, não queria dar muita importância ao som, afinal estava no campo. Apagou a televisão, o som fez-se soar mais alto. Parecia que raspavam na porta... Abria?! Fingia que não estava ninguém?! Resolveu abrir, não devia de ser nenhum assaltante, não costumam fazer barulho.
Abriu a porta e um gato completamente molhado olhava para ela com os olhos esbugalhados.
- Coitadinho! Deves de estar cheio de frio. - Mas quando fez intenção de o agarrar, ele deu costas e fugiu - Não gostas-te de mim?! Paciência.
Fechou a porta e dirigiu-se para o quarto. O barulho na porta voltou a ouvir-se.
-Arrependeste-te?! Com este frio...- calou-se ao ver a cena à sua frente. O gato tinha regressado, mas não vinha só, tinha consigo dois gatinhos pequenos. - Parece que me enganei, afinal és uma gatinha.

O animal miou, como se percebe-se o que ela dizia. E sem a mínima cerimonia entrou em casa e aninhou-se junto à lareira com os gatinhos. Foi à cozinha e abriu uma lata de atum, que ela devorou num segundo. Minutos depois estavam a dormir. Apagou a luz depois de meter mais lenha no lume e foi dormir também.
Os sonhos com Fernando eram recorrentes, acordava vezes sem fim. Agitada e transpirada. Saiu da cama ainda de noite, pelo menos assim lhe aprecia. A família de gatinhos ainda dormia. Meteu água ao lume e fez o pequeno almoço, Ovos mexidos com fatias de presunto. Os gatinhos acordaram com o cheiro, quando deu por si estavam na cozinha a miar.
- Bom dia. Ora bem. pequeno almoço para quatro.- meteu um prato com ovos no chão e numa tigela, algum leite morno para os gatinhos. Comeu enquanto apreciava a cena.
- Ora não, agora toca a ir embora. A loiça fica para mim.- Riu-se, se alguém a visse diria que estava louca, falando com os gatos- Vá, vão lá para a lareira.
A meio da manhã abriu a porta, para que eles pudessem ir embora se o quisessem, o sol já brilhava. Mas os novos companheiros voltaram a casa depois de um pequeno passeio na mata.
- Parece que vieram para ficar... Bem, sejam bem vindos.
Depois do almoço foi dar um passeio, os seus novos amigos ficaram a dormir. Deixou água e comida na cozinha, arranjou uma caixa e colocou lá areia para eles, caso precisassem.
Olhou o céu, não se via uma nuvem, mas estava vento, vestiu um casaco mais forte e saiu.

Sentou-se numa pedra, o barulho da água a cair relaxava-a. Amanhã, ia até à pequena povoação, tinha de comprar mais comida e ver se alguém podia ficar com os gatinhos, quando partisse. E tinha de telefonar a Fernando, já tinha a sua decisão tomada. Trabalharia até ele encontrar alguém que cuidasse de Rita, nessa altura podia partir descansada. Ele tinha de prometer não voltar a tocá-la. E não ficariam sozinhos, só falavam se a Dona Joana estivesse presente. Tinha de ser cautelosa. Se ele a toca-se, todas as suas boas intenções, estariam perdidas. Sabia bem a influencia que ele tinha sobre ela... O vento aumentou de intensidade, olhou o céu, algumas nuvens  começavam a juntar-se. Fechou os olhos, sentindo o aroma que uma nova rajada de vento trouxe até ela. Até a natureza conspirava contra, mesmo ali, podia sentir o cheiro do seu afther shave. Sentiu as lágrimas encherem-lhe os olhos..
- Devia de imaginar que estivesses num lugar assim.

Não, não podia ser!  Tinha medo de abrir os olhos e ver que estava ali, que não era fruto da sua imaginação. Ou pior, que era apenas o desejo de estar com ele, que a fazia ouvir e sentir coisas que não eram reais.
- Pensas ficar calada muito tempo?! No caminho para cá, imaginei mil e uma coisa. Menos que ficasses tão chocada ao ver-me que perdesses a fala.
Mantinha-se calada, tentando assimilar a chegada dele. O que queria?! Como tinha descoberto onde estava?!
- Nem um olá?! Ou um, como estás?! Ao menos convidas-me para um café?! Está um frio...
- Não esperava ver-te aqui. Como deves de calcular. - Levantou-se rapidamente, queria sair dali antes que ele visse que estava prestes a chorar. Na tentativa de fugir, escorregou, e se ele não a tivesse agarrado tinha escorregado encosta abaixo.
O rosto dele estava perto do dela, muito perto, podia sentir o seu coração a bater na garganta
- Tens de ter cuidado, podes cair. - Ele falava, sem a soltar, lembrou-se de outra noite à algum tempo atrás. Fechou os olhos, tentando afastar a imagem. Mas foi um erro, ele aproveitou a proximidade e uniu as duas bocas. Tentou resistir, mas os trémulos lábios reconheceram os deles e entregaram-se sem reservas.
- Tive tantas saudades tuas. - As palavras saiam aprisionadas entre beijos.
- Pára.- Pediu a meia voz, não queria que parasse, mas tinha de parar. - Pára por favor. Não me faças isto.
Ao ouvir o desespero na voz dela parou e afastou-se. Meteu as mãos nos bolsos e esperou que ela se recompusesse.
- E, queres dizer-me, o que estou a fazer?! Para que compreenda e pare...

Não lhe respondeu, tinha tudo mentalmente estudado, os passos todos calculados, as palavras que diria, mas para falar com ele ao telefone, não assim, ali, frente a frente. Sabia, estar perdida se ele a quisesse. O seu coração chorava por ele, assim como o seu corpo.

- Não vais falar comigo?!
Parecia divertido com aquela situação.
- Como está Rita?
- Bem, mandou-te montes de beijos. Tem telefonado todos os dias, ficou preocupada quando não lhe atendeste o telemóvel.
- Não pensei... - Não pensou nela, no quanto sentiria a sua falta. Mas quando partisse... - Desculpa.

Chegaram à cabana, quando entraram, os novos amigos vieram dar-lhes as boas vindas. Ronronando nas suas pernas.
- Fazes amigos com muita facilidade - Acariciou um dos gatinhos - Estavam na cabana?
- Chegaram ontem.
- Como disse, fazes amigos com muita facilidade.
- Senta-te. Vou fazer café.
- Posso ajudar-te.
- Não! - Quase que gritou - Obrigada, mas não é preciso.

Queria estar sozinha. tentar acalmar o seu coração, que batia como se tivesse feito a maratona. E estar junto a ele não ajudava. Colocou as duas chávenas e a cafeteira num tabuleiro e respirou fundo antes de entrar na sala.
Estendeu-lhe a chávena com o liquido a fumegar.

- Quando li a tua carta, pensei deixar-te pensar, como tinhas pedido. Afinal, eu também precisei de me afastar, não para pensar, mas para me concentrar no que precisava fazer. Acaso, cheguei tarde demais?
- Que queres dizer com isso?.
- A tua aliança. Já a substituíste. - Falava como se aquilo lhe fosse penoso. - A julgar pela forma como respondeste ao meu beijo não deve de ser ninguém importante.
Aquelas palavras doeram-lhe mais que se lhe tivesse dado um estalo.
- Tem a mesma importância que dás à tua esposa!- Atirou sem pensar. Não era melhor que ela, o facto de ser homem não lhe concedia esse direito.

Fernando levantou-se e ficou a olhar lá para fora, por uns instantes parecia que ia sair a qualquer altura. Mas manteve-se assim, até que um dos gatinhos se esfregou nas suas pernas. Baixou-se e acariciou o animal.
-Se assim é, posso ter esperança. - Respirou profundamente -Esta manhã, senti a casa mais vazia que nunca, queria que estivesses ali. Como não suportava a tua ausência, resolvi vir buscar-te. Embora tenha decidido dar-te tempo, achei melhor não correr o risco de te perder.
- Não digas essas coisas! - E muito menos se não as sentes, acrescentou mentalmente.
-Preferes que te minta?! Que diga que não penso em ti?! Sei que sentes o mesmo, os teus beijos dizem que também me queres, mas depois, tratas-me com frieza! Bolas, Caty. Que queres que diga?! Diz-me!

Que me amas, como te amo. Que para ti sou mais que um objecto de desejo. Pensou. Que não voltas para a tua mulher. Abanou a cabeça, estava a pedir demais. Apenas desejava a mulher que cuidava da filha. Nada mais. Ela é que não suportaria viver assim. Outras talvez o fizessem, mas ela morreria lentamente, um pedaço todas as noites.

- Nada. Não quero que digas nada. - a voz saiu-lhe tremente - Mas não me podes pedir, que seja tua amante, que continue com... - Faltavam-lhe as palavras - Esta farsa. - Acabou por dizer.
- Farsa?! Achas que isto que sinto é farsa?! - Puxou-a para si - Isto é farsa?! - Beijou-a, ela tentou lutar mas o seu corpo respondia com todo o desejo que ela tentava esconder, precisava do dele, de sentir que ainda a desejava. As mãos dele travaram uma luta com a blusa dela, até que chegaram à sua pele, conteve a respiração. Apenas tinham passado três dias e respondia ás caricias dele como se não se vissem à muito tempo. - E isto?! É farsa?! - Agarrou-lhe a mão e guiou-a até à parte da sua anatomia que mostrava todo o desejo que o consumia. Ao sentir o desejo dele, a sua respiração acelerou.
- Tu também queres estar comigo. Se não fosse assim, não respondias a mim como respondes.
- Desejo! É tudo o que temos! Não posso viver assim.
- Por isso vais entregar-te a ele? E não é só desejo! Sabes isso! - Soltou-a, ao ver-se sem o apoio dos braços dele deixou-se cair no sofá. - Desde quando o conheces?
- Não há nenhum ele. - Podia mentir-lhe, dizer-lhe que tinha encontrado quem a amasse. Mas não estava na sua natureza mentir.
- Não há "ele"?! E este anel?! - Agarrou-lhe a mão.- Isto quer dizer o quê?!
- Apenas decidi por um ponto final, numa fase da minha vida. - Estava mentalmente cansada -Não tinha sentido continuar a usa-la, tudo o representava já não existe.
Ele ajoelhou-se no meio das suas pernas e colocou as mãos em cima das dela ao mesmo tempo que as beijava.
- Isso quer dizer que posso ter esperança? Voltas para casa comigo? Não sabes como tenho sofrido estes dias sem ti.
- O facto de não ter ninguém não significa que volte contigo. Não posso ser o que tu queres. Vou cuidar da Rita até que tu ou a Ju...
- O que raio tem a Ju a ver connosco?! Para a semana vou assinar os papéis do divorcio, e espero nunca mais a ver.
- Como vais assinar?! - Algo estava a escapar ao seu raciocínio -Eu ouvi-te dizer que querias voltar atrás.
- Ouviste?! - Levantou-se e ficou a olhá-la - Parece-me que temos que conversar muito mais do que eu supunha.
Tirou o casaco e meteu mais lenha na quase extinta fogueira. Sentou-se junto a ela.
- Vamos por partes. Ouviste o quê?
- Lembras-te do dia que ficaste a dormir até tarde e depois chamaste o Vitor? - Ele anuiu - Eu fui à sala apanhar a trapinhos e ouvi-te perguntar se podias voltar atrás. E o Vitor disse que podias, como não tinhas assinado os papeis do divorcio.
- E em vez de me perguntares tiras-te as tuas conclusões.
- Como querias que te pergunta-se?  Ficas-te estranho depois da visita da Ju... E ela ia muito contente, lembro-me perfeitamente que disse: "Quando se quer muito uma coisa, consegue-se". Dois dias depois começas-te a afastar-te.
- Meu Deus! E pensas-te que era para me afastar de ti?
- Que querias que pensa-se? A tua irmã disse que perdoas tudo à Ju!
- A minha irmã! - Levantou-se - Por onde começar?! Nunca amei a Ju, apenas casei porque estava grávida. E pensei que nunca iria encontrar alguém que amasse. Tinha trinta e cinco anos e nunca tive  um relacionamento serio... Conhecemos-nos desde a escola, e saímos algumas vezes. Desejava-a é bonita, sensual, tu viste... - Calou-se ao ver a expressão no rosto dela - Quando ela me disse que estava grávida, tinha de assumir as minhas responsabilidades.
- Mas não havia necessidade de casar! Isso já não se usa.
- Eu sei. Mas não queria que o meu filho nascesse fora do casamento, e o aborto estava fora de questão! Os meus pais não cabiam em si de felicidade, com a ideia de serem avós. Junta a isso o facto de nunca ter amado ninguém, e tens a receita para um casamento de conveniência. Na altura achei estar a fazer o mais acertado. Depois quando abortou, senti-me na obrigação...
- Abortou?!
- Sim. Esteve grávida antes da Rita. - Fez um esgar de desgosto - Soube depois que esse filho não era meu.
- Meus Deus!
- Quando soube, pedi o divorcio. Poucos dias depois trouxe um exame de gravidez. Estava grávida, e desta vez era meu. - Um sorriso sarcástico apareceu-lhe no rosto -Se eu quisesse ela fazia o teste. Jurou que não sabia que o filho anterior não era meu. Como não éramos namorados, ela andava com outro, supôs ser meu pela data. Bem, não interessa. Um rol de mentiras. Com uma nova gravidez não a podia abandonar.
- Tens a certeza que é tua, ou simplesmente ignoras o facto porque gostas dela?
- Sim, é minha. Eu tentei, e muito,  que as coisas fossem como ela merece. - Respirou fundo -Nem nos meus piores sonhos, imaginei que as coisas terminassem assim. A forma como trata a filha... Não gosto de falar disso. Magoa-me demais. A minha mãe é que cuidou dela desde que nasceu, mesmo com o meu pai doente. Esteve muito mal, e pensei que...

A dor estava presente na voz dele assim como na postura. Era um homem vencido. Gostava de poder aliviar a dor que o martirizava. Abraçou-o por trás, encostou a cabeça às costas dele. Fechou os olhos e deixou-se ficar, ouvindo o bater do coração dele.  As mãos dele cobriram as dela com carinho. Podia não a amar mas algum sentimento ele nutria por ela. Ele voltou-se e em questão de segundos beijavam-se como se tudo estivesse explicado. Os beijos cada vez mais exigentes, as mãos mais desejosas de caricias foram despojando os corpos das roupas. Quando entraram no quarto restava apenas a roupa interior.
- Tenho tanto que contar-te... - A boca dela calou o que ele queria dizer.
- Depois.
Desta vez foi ela que teve a última palavra.

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