Quando ouviu o carro de Philippe ao longe, sentou-se pensativa. Como podia continuar a amar um homem que a fizera sofrer tanto e lhe mentiu? A sua mente voltou novamente àquele tempo em que depois de alguns contratempos, pensou que era a mulher mais feliz ao cimo da terra.
Meses depois Philippe regressou da mesma forma que partiu, sem aviso prévio. Estava tão feliz por o ver, que acordava a sorrir na expectativa de o voltar a encontrar. Ficou fascinada por ele desde o primeiro dia e sabia que ele sentira algo, mas não percebia porque a beijou para depois a afastar quando soube que era afilhada de Isabelle. Isso era algo que a intrigava! Mas seria por pouco tempo, ela sabia exactamente como descobrir o motivo.
- Acho que vais meter-te na toca do lobo. - Matheus não concordava com a ideia - Ele é bem mais velho, logo mais experiente.
- Apenas mais oito anos. Não sabia que eras tão conservador.
- Quase nove! E não sou, apenas acho que devias de ter cuidado. Mas sei que não te vou demover, és teimosa como a tua madrinha. Metes-te na cabeça que estás apaixonada e pronto.
- Sei que estou. - Isi suspirou e entrou no carro do amigo - Desde que ele partiu que a minha vida deixou de ter graça, não consigo esquecer o beijo dele, aqueles olhos...
- Admitindo que estás apaixonada. Achas boa ideia confrontá-lo com isso?!
- Porque não?! - Isi ajeitou-se no banco e alisou a saia do colégio - Podes deixar-me em casa?
- Claro.
Matheus não entrou, ela despediu-se dele com um beijo na face e entrou disposta a colocar em prática o seu plano. A madrinha estava no escritório e Philippe estava na sala, podia ouvi-lo ao telefone. Subiu e mudou de roupa, apanhou a agenda onde anotava as ideias para a próxima festa de Isabelle. E foi para a sala onde ele estava. Quando entrou estremeceu ao sentir os olhos dele no seu corpo, vestira uns calções que, embora não muito curtos, mostravam as pernas bronzeadas e uma camisa de cetim que deixava a descoberto a curva do seu peito. Viu no seu olhar um brilho de desejo, sentiu-se confiante.
- Boa tarde. Importas-te? - Ela sorriu e Phlippe devolveu-lhe o sorriso - Não gosto de trabalhar no escritório.
- Trabalhar? Ah, sim. Tinha esquecido, as festas que Isabelle dá.
- Sim. E dão mais trabalho do que as pessoas pensam.
- Imagino que sim. Bem, estou de saída.
- Philippe?! - Isi chamou-o - Posso tratar-te assim?
- Claro. - A voz dele ouvi-se mais rouca que o normal.
- Porque me beijas-te? - Ele ficou a olhá-la sem silêncio - Fiquei intrigada e confusa.
- Confusa?
- Parecias interessado e depois... puf! Todo o interesse desapareceu ao saberes quem era. Tens medo da minha madrinha?
Philippe riu e aproximou-se dela.
- Ma petite... Medo?! Não, respeito pela mulher que ela é. Isabelle é uma amiga querida, não quero arruinar uma amizade por uma miúda.
Ma petite?! Miúda?! Estava a ouvir bem?! Ele julgava que era uma criança?! Sentiu-se enfurecer.
- Para tua informação tenho quase dezanove anos. Se Isabelle fosse minha patroa a idade não era impedimento para... - Ela tentava encontrar a palavra adequada - os teus avanços. Estou certa?
- Dizes bem, se fosses mais velha. - Philippe calou-se por uns instantes - Isabelle falou-me na afilhada que andava no colégio. Pensei que fosse uma criança. E caso não tenhas notado, ninguém diria que tens dezoito anos, desculpa, quase dezanove! Deixei-me levar pelas aparências. Admito que me senti atraído, mas prefiro mulheres experientes.
- E quem te disse que não sou?! - Mordeu o lábio, sabia que estava a mentir, nunca esteve com um homem e seguramente isso notou-se na forma como beijou.
- Não brinques com o fogo ma chérrie. - Philippe afastou-se dela sorrindo.
- E se disser que te amo.
Philippe parou de costas voltadas para ela, mas não a olhou. Apanhou o casaco que estava em cima da cadeira.
- Como te disse, não brinques com o fogo ma chérrie. Podes queimar-te.
Isi ficou a olhá-lo até desaparecer escadas acima. O resultado não foi o esperado, admitiu o que ela sabia, que se sentiu atraído mas nada mais. Tinha imaginado que ao dizer-lhe que o amava a tomava nos seus braços e...
- Se o próximo jantar vai ter essa decoração, acho que devemos adiar. - Isabelle beijou a cabeça da afilhada e bateu com o dedo nos riscos que ela tinha da agenda. - Problemas?!
- Não. - Isi ajeitou-se no sofá para Isabelle se sentar junto a ela - Madrinha?!
- Sim.
- Como sabemos que aquela pessoa é a tal?
- Ui! Estamos apaixonadas?! - Isabelle abraçou-a carinhosamente - O amor não se explica, sente-se aqui - Disse tocando o peito dela - Quando o encontrares não precisas de nada em concreto e contrariamente ao que se diz, não é preciso muito tempo, uns minutos são suficientes para saber.
- Porque nunca te casaste?
- Agora falamos de mim?! - Isabelle forçou um sorriso - Bem, simplesmente nunca aconteceu. Mas isso não quer dizer que não me apaixonei. Amei, e muito, mas a vida é complicada.
- Ele não te amava?
- Naquele tempo achei que não, hoje sei que não era assim.
- Que aconteceu?!
- Como se afastava de mim pensei que não me amasse, mas afinal era receio que eu não o amasse.
- Suposições.
- Um conselho de madrinha. Nunca suponhas nada.- levantou-se do sofá, estava visivelmente emocionada - Bem, vou deixar-te com os teus... riscos. - Isabelle parou na entrada da sala - Já me esquecia, hoje tenho uma reunião no clube, podes fazer companhia a Philippe?! É de má educação sair assim, mas é inevitável. Eu explico-lhe durante o jantar.
- Combinei jantar com Matheus mas volto cedo.
- Matheus! - Isabelle piscou o olho - Será o afortunado?!
- Isabelle!!! - Isi fez uma careta antes de sorrir para a madrinha.
Sentiu uma certa pena da madrinha, amou e por medo nunca lhe foi permitido viver esse amor. Mas isso não ia acontecer com ela, estava decidida a lutar para conquistar Philippe. Agora que sabia que ele se sentia atraído por ela usaria isso em seu favor.
Ao fim da tarde subiu para tomar um duche e vestir-se, tinha de vestir algo especial, Matheus queria apresentar-lhe uma pessoa. Preferia vestir as calças que ela tanto adorava mas achou que um vestido seria mais apropriado para a ocasião. A escolha recaiu sobre um vestido branco simples, estilo deusa grega. Apanhou o cabelo e prendeu-o no alto da cabeça com uma fita preta. Aplicou o seu perfume preferido, Magic nigth e desceu.
Isabelle estava na sala com Philippe quando ela desceu, notou que ele a seguia com o olhar enquanto se aproximava e se despedia da madrinha, fez um aceno com a cabeça na direcção dele despediu-se com um mero "Sr. Durant" e saiu triunfante, consciente que ele a seguia com o olhar. Enquanto vestia o casaco ouviu a madrinha elogia-la e desculpar-se pelo encontro que ela tinha com Matheus.
O táxi esperava por ela na entrada, preferiu ir de táxi pois Matheus queria ir cedo para o restaurante. Ele não tinha muitos amigos que aceitassem a sua sexualidade, mas ela não via problema algum nisso, cada pessoa deve de ser livre para amar e ser amada, só assim se alcança a plena felicidade. Nessa noite conheceu Hector, simpatizou imediatamente com ele, sabia manter uma conversa interessante, bom anfitrião, simpático divertido e bonito. E fez questão de o dizer a Matheus quando ele a acompanhou a casa, por sugestão de Hector. Quando entrou em casa ria-se de uma anedota que Matheus contou. Olharam para Philippe que apareceu na porta da sala ao ouvir as vozes. Retribuiu o boa noite e voltou para a sala, os dois subiram as escadas em direcção ao quarto dela.
- É este. - Isi entregou-lhe o livro sobre o qual Hector tinha falado durante o jantar.
- Parece mais velho que a tua cozinheira.
- Não sejas parvo. Agora que tens o livro podes ir.
- Hum, estás a mandar-me embora?!
- Não. Isabelle pediu-me para fazer companhia a Philippe.
- Coisa que vais fazer contrariada. - Matheus deitou-se na cama dela rindo- Não sei o que viste nele.
- É lindo...viste bem os olhos dele?! Aquele corpo bem delineado - Isi deitou-se ao lado dele - Aiai... se fechar os olhos consigo vê-lo deitado, respirando tranquilamente.
- Ou seja, uma atracção, não amor.
- Não à amor sem atracção. É bom sentir-se atraído e melhor ainda amar, mas amar e sentir-se atraído é sublime.
- Falou a esperta em relações.Esqueci-me dos teus inúmeros namorados - Olharam-se e desataram a rir até que ela lhe beliscou o braço- Ei! Isso doí.
- Vai. Hector está à tua espera.
Isi abriu a porta e saiu para o corredor esperando por ele.
- Vou porque te adoro.
Matheus meteu o braço sobre os seus ombros e começaram a descer as escadas
- És um bajulador.
- Tu adoras que o faça, tanto como eu gosto de o fazer. - Matheus olhou na direcção da sala - Vejo-te amanhã?
Isi deu a face para receber o beijo dele e ficou na porta a vê-lo partir no carro. Entrou e começou a subir as escadas, mas voltou a descer os poucos degraus que tinha subido e entrou na sala. Philippe ainda estava a olhar pela janela que dava para o jardim.
- Isabelle pediu-me para te fazer companhia. - Disse calmamente - Mas se...
- O teu amigo? - Interrompeu-a.
- Matheus?! Já foi.
- É teu namorado?
- E se for?! Acho que isso não te diz respeito.
- Não?! Pensei que querias saber porque te beijei.
- E que tem Matheus a ver com isso?!
- Nada ou talvez tudo. Talvez queira saber se tens tanta experiência como dizes. Ou confirmar se me amas.
- Ou seja, a mulher que sair contigo não pode ser vista com outro homem.
- Mais ou menos, mas tudo depende da mulher.
- Não. Depende do carácter do homem. - Machista! Começou a sentir a raiva crescer dentro dela enquanto as lágrimas brilhavam nos seus olhos. - Boa noite, vou deitar-me.
Mas não foi mais além do sofá, não percebeu como ele se colocou junto a ela tão rápido, segurou-a pelo braço e fixou os seus olhos. Acto seguido puxou-a contra o seu corpo e beijou-a, sentiu na boca o sabor a whisky. Afastou a boca mas manteve a cabeça encostada à dela.
- Deixa-me ir! - Esforçou-se por controlar as lágrimas.
- Não chores, não suportaria ver-te chorar.
- Então solta-me. - Tentou soltar o braço sem êxito - Já vi que me enganei a teu respeito.
- Talvez não estejas tão enganada como supões.
- Não?! - Algo na voz dele a fez acalmar
- Ma petite... - Murmurou, os dedos dele brincavam com a alça do vestido - J´ai essayé... Mon dieu... J´ai essayé...
- Não estou a perceber. - Isi não se afastou - E pára de me chamar petite. Não gosto.
- Tentei não pensar em ti, esquecer-te. Sabia que ver-te ia reavivar o que lutei por esquecer, mas não estava preparado para os sentimentos que me assolaram ao ver-te com Matheus. Isso fez-me assumir que sinto por ti mais do que queria.
- E o que sentes? - O coração dela batia tão furiosamente que podia ouvi-lo na sua cabeça.
- Quero que sejas minha. - Com os cabelos entrelaçados na mão puxou-a para mais perto - Pensei esperar algum tempo, mas nunca fui muito paciente.
- Como se depois daquele beijo pudesse ser de mais alguém.
- Quero estar contigo - Philippe sorria - Mas não aqui.
Philippe voltou a beijá-la e desta vez ela rodeou o pescoço dele com os braços. Afastaram-se quando ouviram a porta de um carro a fechar-se.
- Isabelle chegou. - Philippe deu-lhe um pequeno beijo - Sobe. Tens o batom esborratado. Não quero travar uma batalha com a tua madrinha. Não sem antes lhe explicar a situação.
Isi subiu as escadas a correr, quando estava a chegar ao quarto ouvia a porta da entrada a fechar-se. Despiu-se e dançou com o vestido pelo quarto. Ele queria estar com ela! Deitou-se sorrindo e quando o dia amanheceu ainda estava a sorrir. Desceu cantarolando uma musica que ouviu na radio enquanto tomava banho. Isabelle e Philippe já estavam a tomar o pequeno almoço.
- Bom dia! - Beijou a face da madrinha e sorriu para Philippe - Está um dia lindo!
- Bom dia. - Isabelle sorria para Isi - Aparentemente a noite correu bem.
- Fabulosa. - Disse enquanto apanhava uma torrada e bebia um sumo de laranja - E a da madrinha?
- Igualmente fabulosa. - Isabelle fez uma careta para a afilhada- Rapariga senta-te como as pessoas civilizadas. Que pensará Philippe de ti?!
- Não posso, estou atrasada e acho que Philippe não vai pensar horrores de mim. - Isi lutou contra a tentação de olhar directamente para ele - Matheus deixou-se dormir. Tenho de pedir a Vince que me leve.
- Não interessa se estás ou não atrasada, senta-te e come. Entretanto vou falar com Vince.
- Se Isabelle concordar posso deixar Isabelle no colégio.- Interrompeu Philippe.
- Tens de a tratar por Isi, como todos. Ou vais confundir-me. De certeza que não te importas?
- Claro que não, vou apenas fazer um telefonema.
Isi sentou-se e sorriu para a madrinha quando ele deixou a sala.
- Sabes?! Estive a pensar, na festa de primavera.
- Sim?! - Isabelle olhou a agenda que ela lhe estendia - Que surpresa, os riscos foram substituídos.
- Imaginei uma festa nos jardins, alugávamos umas tendas, em creme ou branco ovo e fazíamos um baile de máscaras.
- Máscaras?!
- Sim. Olha- Isi mostrou uns desenhos - Escolhíamos um tema, renascentista, vanguardista, romântico... As hipóteses são múltiplas. E depois procedíamos à decoração de acordo com...
- Quando quiseres ir. - Philippe interrompeu os projectos dela.
- Vai, logo falamos. - Isabelle voltou-se para Philippe que aguardava junto à porta da sala - Se à algo que a faça perder noção do tempo é a decoração. Esquece tudo o mais.
- Até logo - Beijou a face da madrinha e dirigiu-se para a porta.
Depois de dar as indicações do colégio o silêncio instalou-se no carro. Agarrou a sua agenda e começou a fazer uns esboços.
- Estás a estudar o quê?
- Quero ser decoradora de interiores e realizar eventos. Desculpa. - Isi percebeu que não tinha respondido à pergunta dele - Artes. Estou a estudar artes.
- E gostas?
- Sim. Penso futuramente ir para a faculdade de belas artes e depois abrir um espaço meu.
- Tens tudo planeado.
- Gosto de ter tudo controlado.
- E se o destino, caso acredites nele, te escolher outro rumo?
- Não sei. Não gosto de surpresas.
- Isso quer dizer que não te posso surpreender?!
O som do telemóvel tirou-a da divagação. Atendeu, pensando em como ele a conseguiu surpreender.
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