Alisia acordou sobressaltada e sentou-se na cama assustada. Tinham passado vários dias desde a fuga de Priscilla, mas ela ainda tinha pesadelos com isso. Na noite anterior o seu coração palpitava tanto, que teve de ir até ao quarto dela verificar se estava lá.
- Outro pesadelo?
Nicholas sentou-se na cama. Começava a habituar-se àqueles despertares a meio da noite.
- Sim.
- Ela prometeu que não voltava a fazê-lo.
- Eu sei, mas é mais forte que eu.
- Se que sim. Também fiquei muito preocupado quando não a encontrámos durante a primeira noite.
Mas temos de pensar que apenas o fez porque estava preocupada contigo, não o faria noutras circunstâncias. Foi uma vez sem exemplo.
- Isso é que me preocupa. Que seja a primeira de outras.
- Porque o faria?
- Não sei. - Alisia forçou um sorriso - Esquece, são apenas preocupações de mãe.
- Se te preocupa não posso esquecer.
- Vamos tentar pelo menos.
Mas Alisia não conseguia esquecer, quando Nicholas voltou a adormecer, ela ainda pensava na quantidade de vezes que a filha tinha dito que queria fugir de casa. Coisa que acontecia com demasiada regularidade no último ano que viveram com Mat. Sentiu um aperto no coração ao recordar todas as vezes que deu com Priscilla a chorar no seu quarto depois de Mat gritar com ela. No início do seu casamento com Mat elas eram felizes e Priscilla adorava Mat. Mas bastaram dois anos para que a filha mudasse de opinião e começasse a dizer que preferia não viver com ele. Nunca aceitou Mat como pai. Ele sempre fora o marido da sua mãe, nada mais que isso! O que a levava a pensar em Nicholas. Priscilla adorava-o, isso era evidente. Mas, e se deixa-se de gostar dele como deixou de Mat?! Tentaria fugir de casa?! Se conseguiu chegar à ilha com doze anos, quando fosse mais velha o mundo não teria portas. Amava Nicholas mas Priscilla era a sua vida! Como ter a certeza que casar com ele era o correto a fazer?! Como saber que não estava a cometer o mesmo erro que com Mat?! Adormeceu sentindo as lágrimas quentes molharem o rosto.
- Mãe?! Mãe?! - Priscilla sussurrava.
- Que aconteceu? - Ao reconhecer a voz da filha sentou-se rapidamente na cama
- Nada. Vamos a casa. - Priscilla sentou-se na cama - À outra, temos de apanhar King, algumas coisas nossas e tu tens de falar com os teus clientes.
- Isso decidiste tu?! - Alisia sorriu para a filha ao ver o ar serio dela.
- Foi Nicholas que decidiu.
- Nicholas?!
Naquele momento lembrou-se que ele tinha dormido ali e olhou a cama. Felizmente estava vazia.
- Sim, ele está no escritório com Zoe! - Priscilla olhava o tapete - Mãe, posso perguntar-te uma coisa?!
- Diz.
- Nicholas também vai dormir noutra cama?
- Como assim?! - Alisia sentiu o coração encolher-se.
- Mat dormia sempre noutra cama... Tu dizias que era porque ele estava doente... Mas Nicholas não é doente e dorme no quarto dele, que eu viu-o sair.
- Dorme?! - Alisia sorriu perante a frontalidade da filha
- Porque não podem dormir agora?! A mãe de Mary dorme com o namorado. Tu também podias.
- Vou pensar nisso.
- Posso chamar-lhe pai?!- Priscilla saltou da cama - Vou-lhe perguntar...
- Priscilla...
Mas a filha não a ouviu, ou se ouviu não o deu a entender. A verdade é que não sabia o que Nicholas pensava sobre o assunto. Mas enquanto tomou duche pensou detalhadamente sobre isso. Nicholas adorava Priscilla e ela adorava-o. Não, ela achava que ele era um príncipe! Sorriu ao recordar o rosto da filha, estava feliz, podia ver isso no olhar dela. Talvez estivesse a imaginar coisas ao temer casar com ele. Apesar de saber o que ela pensava dele não a abandonou quando soube que Priscilla tinha desaparecido, incomodou amigos e outros menos amigos para a encontrar. Provou que se preocupava com elas e que o que sentia por elas era real. Mas porque sentia aquele aperto ao pensar em casar?
- Que estás a fazer?! - Nicholas sorria na entrada do quarto.
- A fazer a cama!
- Sabes que essa é a função das raparigas?!
- As raparigas?!
- Sim, elas precisam de trabalho, eu preciso da casa limpa. Porque contratar alguém de fora?!
- Desculpa, não sabia.
- Preferes ter alguém constantemente aqui em casa?! Eu gosto da minha privacidade, mas se quiseres alguém permanente podemos contratar.
- Oh, não! Está bom assim, até porque algo tenho de fazer.
- Acho que depois de uns dias com Zoe vais encontrar muito que fazer. - Nicholas abraçou-a pela cintura. - Agora esclarece-me uma coisa. Percebi mal, ou a nossa filha, foi dar-me autorização para dormir na tua cama?!
- Nossa?! - Alisia sentiu as lágrimas nos olhos ao ouvi-lo.
- Claro! Penso adoptá-la depois de nos casarmos.
- Achas seguro?!
- Porquê?! - Nicholas olhou para ela se sobrolho carregado mas depois relaxou - Não tens do que te preocupar, és a mãe dela. Isso não se vai alterar, já falei com um amigo meu que é advogado. Ele vai tratar de tudo.
- Disseste-lhe?!
- Não. Isso é um assunto privado. Apenas lhe disse que queria adoptar Priscilla depois do casamento.
- Obrigada, não sabes como é importante para mim.
- Posso imaginar, mas estás a fugir ao assunto. Estávamos a falar de poder dormir contigo.
- Não me recordo de teres dormido noutro lado.
- Mas agora é diferente, tenho autorização.
- E isso faz diferença?
- Imensa...
Quando o avião aterrou no aeroporto Nicholas foi com Priscilla apanhar King ao gatil enquanto ela ficou no centro comercial para falar com os clientes. Sentia uma certa pena ao deixar de fazer bolos, gostava de os fazer e sentia que estava a faltar ao seu compromisso para com eles. Esteve aqueles dias sem os fornecer, mas porque não sabia de Priscilla. Naquele instante ocorreu-lhe uma ideia. Quando Nicholas e Priscilla de juntaram a ela, ainda estava na pastelaria confirmando números e anotações na sua agenda.
- Falas-te com todos? - Nicholas rodou a agenda de forma a ver as anotações dela. - Parece que não. Priscilla não queres ir comprar um gelado?
- Vou já... Vamos King, eles querem falar.
Alisia olhou para ele sem perceber porque mandou Priscilla comprar um gelado.
- Pensei que ias falar com eles e explicar a situação, mas parece que me enganei. A julgar as anotações, vais continuar a fazer bolos.
- Acho que é uma estupidez deixar de os fazer. Gosto de os fazer e eles contam comigo, se eu...
- E eu?! - Nicholas interrompeu-a - Onde fico nisto tudo?
- Como assim, onde ficas?
- Se já decidiste continuar com os teus bolos, é porque não vais regressar comigo.
- Claro que sim! - Alisia olhou para ele sem perceber - Não pensei em ficar! Olha, estive a ver as minhas anotações. - Ela mostrou-se uma folha - Geralmente pedem sempre o mesmo e na mesma quantidade. Pensei que podia ensinar algumas raparigas e assim elas podiam...
Não terminou de falar, Nicholas colocou uma mão no pescoço dela e segurou-a carinhosamente enquanto a beijava alheio ao olhares dos outros clientes da pastelaria.
- Mãe... Pai... As pessoas estão a olhar!
Ao ouvirem Priscilla chamá-lo de pai, separaram-se mas sem desviarem o olhar um do outro. Alisia sentiu um nó na garganta. Priscilla não voltaria a fugir, agora tinha a certeza! A filha aceitara Nicholas na vida delas! E a prova estava no facto de lhe ter chamado pai!
- Sério?! - Nicholas falou sem deixar de olhar Alisia - Amo-te! Não voltes a assustar-me assim!
- Assustar-te?!
- Pensei que preferias ficar.
- Não penso abandonar o pai da minha filha.
- Mas podemos abandonar a pastelaria?! - Priscilla olhou para os dois e agarrou em King ao ver que eles continuavam sem se mexerem. - Vamos King, estão esquisitos... Lembra-me de nunca me apaixonar!
Alisia entrou na igreja para se despedir dos seus santos. Ainda sentia aquele aperto no coração mas tinha a esperança que um dia ele iria desaparecer. Enquanto olhava os santos ouviu um leve barulho, voltou a cabeça e viu a senhora de sorriso doce a olhar para ela. Fez uma vénia na direcção do altar e dirigiu-se a ela sorrindo.
- Olá.
- Olá minha filha. Vejo que a dor saiu dos teus olhos. As férias foram boas?!
- Sim.
- Mas ainda esperas um sinal.
Alisia olhou para ela, como sabia que esperava um sinal?! Que toda a sua vida esperou um sinal que lhe indicasse o caminho?!
- Sim. Acho que vou esperar sempre.
- Talvez já tenha chegado e não o tivesses visto.
- Talvez. Mas acho que não interessa mais. - Alisia sorriu para ela - Vou casar.
- Fico feliz por ti. Parabéns.
- Obrigada. Mas também vim despedir-me e agradecer-lhe.
- Agradecer-me?! Não fiz nada.
- Sim fez. Ouviu-me e muitas vezes é quanto basta.
- Oh, isso. Temos de cuidar dos anjos que ainda restam. É o noivo?
Alisia olhou para a senhora que sorria enquanto olhava um ponto atrás dela e segui-lhe o olhar. Nicholas entrava na igreja. O seu coração deu um salto. O sol do fim da tarde entrava pelo vitral lateral e batia no seu corpo dele. As partículas que se moviam no ar brilhavam com os raios do sol revelando a aura dele. Pareceu-lhe que o arco-íris lhe tinha emprestado as suas cores. Duas lágrimas deslizaram pelo rosto dela ao notar que o aperto que sentia desaparecera. Olhou para a senhora mas esta não estava, percorreu a igreja com o olhar sem êxito, ela desaparecera. Sorrindo agradeceu mentalmente aos santos e principalmente à senhora de sorriso doce. E com a certeza que aquele era o sinal que esperara toda a vida, juntou-se a Nicholas para iniciarem uma vida em comum.
FIM
Deslumbrante, é a palavra que me surge na mente ao acabar de ler. Ficou muito bonita e algum suspense. Adorei.
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