quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

ENCONTROS AZARADOS 11ª PARTE



Caterine olhou fixamente para ele. Tinha acabado de tomar banho! Aquilo só podia significar uma coisa. Jess tinha-lhe mentido! Mas porque todos lhe mentiam e manipulavam!?
Apesar de se sentir enganada não conseguia deixar de olhar para ele, Jess tinha razão, ele estava a sofrer. Ou era a roupa preta que o fazia parecer mais triste!?  Estava visivelmente mais magro e o olhar estava coberto por uma profunda tristeza. Não lhe devia ter mentido.

- Desculpa! Não o devia..
- E achas que um pedido de desculpa apaga tudo? - Nathan mantinha o olhar na barriga dela.
- Sei que não. Mas neste momento não posso fazer nada mais.
- Ainda não acredito que me mentiste!
- Oh pelo amor de deus! Se fosses tu a mentir não havia problema , mas como fui eu já é imperdoável.
- Nunca te menti!

Ao ouvi-lo negar o que ela sabia ser certo, sentiu a raiva crescer dentro dela e todas as boas intenções de se sentarem e falarem calmamente desapareceram.

- Não só mentiste como usaste! Só querias arranjar forma de chegar a Jess.
- Achas que te usei para me aproximar da minha irmã?!
- Não acho, tenho a certeza!
- E devido a essa certeza, disseste que tinhas abortado?!
- Não o devia ter dito, foi cruel da minha parte.
- Cruel!? Não foi cruel, foi monstruoso.
- Não me dizes nada que eu não saiba! Mas se tivesses aceitado falar comigo já saberias a verdade.
- Típico! Agora sou o culpado!
- Em parte sim. Mas isso não interessa mais. Como disse à tua irmã não te vou responsabilizar. Afinal sou adulta e não me obrigaste a nada.
- Está enganada. Interessa e muito. Esta situação tem de ficar esclarecida. - Nathan segurou-lhe o pulso - Não vou ficar longe do meu filho.
- Teu filho?! - Caterine sentiu a mão dele apertar-lhe furiosamente o pulso e desejou magoá-lo - Mais meu que teu, já que eu é que carrego com ele! - Caterine puxou o braço e afastou-se - E já que estamos a esclarecer certas coisas, podes anotar que faço questão de o educar sozinha. Não quero que lhe incutas essa falsidade toda.
- Falsidade?!
- Sim. Porque é a única coisa que me ocorre quando penso na forma como planeaste as coisas.
- Desculpa?!

Nathan aproximou-se novamente, mas Caterine não olhava para ele, olhava a chuva que batia na janela. Desejou que a água limpasse toda a dor que sentia. Um relâmpago iluminou o céu e ela começou a falar como se não conseguisse controlar a mágoa que tinha dentro de si.

- Não sei como, mas planeaste tudo muito bem. Os encontros desastrosos para eu não suspeitar, as conversas, levaste-me a conhecer Mabell e Rose! - Caterine continuava  - Por acaso tens consciência que Mabell está preocupada contigo? Não! Porque não te importas com o que os demais sentem!
- Não te admito!
- Até me pediste em casamento! Mas como pude cair na mesma conversa outra vez?! Vocês são todos iguais! - Caterine tentou controlar as lágrimas sem sucesso - Não fiquei satisfeita da primeira vez. Não, tinha de cair na mesma teia! Tinha de acreditar no que me dizias, e para provar como sou idiota ainda me apaixonei por ti como...

Caterine calou-se quando Nathan colou o corpo ao dela. Por instantes sentiu as pernas tremer e o coração começou a bater descompassado. Ao sentir a mão dele no pescoço, entreabriu os lábios e involuntariamente passou a língua por eles. Pouco depois esta foi substituída pelos lábios de Nathan que exigiam dos dela uma resposta. Rendeu-se ao beijo e a única coisa de que tinha consciência era do calor que emanava do corpo dele.

- Agora podes continuar.
- O quê?!
- Falavas do que sentes por mim.
- Odeio-te! - Caterine bateu-lhe no peito.
- Não foi isso que disseste. - Nathan beijou-lhe os lábios brevemente - Disseste que me amavas.
- Disse?!
- Por outras palavras, mas sim.
- Pois podes esquecer!
- Como vou esquecer se espero ouvir isso desde que te conheço?! - Nathan voltou a beijá-la - Amo-te desde que te vi pela primeira vez.
- Depois de tudo esperas que eu acredite nisso?!
- Quando dizes tudo, estás a pensar precisamente em quê?
- Tudo é tudo! Os nossos encontros "acidentados" supostamente ocasionais, na forma como me levaste a pensar que eras uma pessoa diferente do que realmente és!
- Em primeiro lugar, sou exactamente como tu viste, bem, não tão desastrado! Em segundo, não duvides do que sinto por ti. Nunca fui tão sincero como quando te pedi para casares comigo. - Nathan sacudiu-a levemente - Achas que ia provocar aqueles encontros propositadamente?! Convenhamos, não são a melhor forma de conquistar uma mulher. E se bem te lembras demoraste a aceitar beber um café comigo.
- Cappuccino. - Caterine começava a achar que tinha exagerado.
- Isso. Se apenas pensasse em aproximar-me da minha irmã teria dramatizado a história com o propósito de te convencer. Juro que não sabia que eram amigas.
- Não?! - Caterine começava a achar que tinha exagerado.
- Não. Quando me convidaste para jantar com os teus amigos suspeitei ao ouvir o nome de Jess. Mas depois falaste que eram sócias. Ora tu trabalhas em decoração, Jessica adora cozinhar. A tua amiga estava casada, a minha irmã vivia com uma mulher.
- Casou com uma mulher!
- Eu sei. - Nathan beijou-lhe a testa - Pensei que não era a mesma pessoa, afinal há imensas pessoas com o mesmo nome. Era apenas uma coincidência. Resolvi esquecer.
- Podias ter-me contado.
- O quê?! Que a minha irmã não me falava porque fui um idiota chapado? Obrigada mas não! Tenho o meu orgulho!
- E também algum preconceito!
- Não! Nunca tive. Bom, nunca até me ver na situação de aceitar alguém próximo.
- Ou seja, se algum desconhecido assumir a sua homossexualidade muito bem , mas a tua irmã não pode!
- Não é bem isso. - Nathan afastou-se um pouco - Não te consigo explicar. Tinha-me imaginado a levá-la ao altar, a passear os meus sobrinhos...
- Ou seja, imaginaste como seria a vida da tua irmã e isso acabou por separar-vos.
- Não foi apenas isso que nos afastou, mas nesse aspecto terás de confiar em mim.
- Ou seja, não me vais dizer.
- Não me cabe a mim dizer.

Jess entrou naquele instante e ficou a olhar para eles com os olhos cheios de lágrimas, depois sorriu tristemente e ajeitou a mala no ombro.

- Apenas vim confirmar que estava tudo sob controle. Não sou muito boa a elaborar planos - Jess olhou para Nathan - Ouvi uma boa parte da conversa. Se isso é o que vos impede de ficarem juntos, podes dizer.
- Tu nunca...
- Eu sei. - Jess interrompeu o irmão - Confio em ti para relatares a situação o mais leve possível.
- Jess, não pretendo... - Caterine olhou para ela sentindo o coração despedaçar-se.
- Eu sei que não. Mas existem demasiadas coisas entre vocês.


Depois de Jess deixar a cozinha, Caterine ficou a olhar para o local onde esta estava até que Nathan lhe colocou a mão nas costas.

- Acho que devíamos ir para a sala.
- Não quero saber de nada se isso vai magoar Jess. Ou a ti!
- Talvez custe um pouco falar do assunto, mas Jess tem razão. Existem coisas entre nós, coisas que precisamos arrumar antes desse bebé nascer. - Nathan sentou-se ao lado dela e ficou a olhar para o chão - Sabes que Jess é esquerdina. - Caterine anuiu mas ele não olhava para ela - Quando os meus pais partiam de viagem ficávamos com o meu avô, eu adorava-o. Passava muito tempo com ele a pescar ou a fazer campismo. Para mim não havia nada melhor que estar com ele, mas Jess não gostava dele e eu não percebia porquê! Um dia, devíamos de ter uns dez anos, ela negou-se a ir. E quando se viu pressionada disse que não ia porque o avô lhe atava a mão esquerda para a obrigar a usar a direita. E que lhe batia com uma régua de madeira quando estava a fazer os deveres se não usava a mão "correta".
- Que horror!
- Ninguém achou o meu avô capaz de tal coisa, os meus pais apenas disseram que era uma forma de chamar a atenção, mas eu disse-lhe que era mentirosa e que estava a inventar aquilo porque o avô gostava mais de mim. Ela não me respondeu, olhou para mim e entrou no carro. Isso foi o início da nossa separação. Anos depois disse-me que era lésbica. Recordo que lhe disse coisas horríveis. Coisas que ninguém devia ouvir, muito menos de um familiar. Tenho plena consciência, fui cruel e mesquinho! - Nathan baixou a cabeça - Ela apenas sorriu e disse para sair do quarto dela. Dias depois saiu de casa para fazer um curso e eu fui para a universidade. Quando terminei os estudos juntei-me a um amigo e fomos como voluntários de uma ONG. Vi as maiores misérias que possas imaginar e conheci pessoas com a mesma opção de vida de Jess. Pessoas que me mostraram o idiota que estava a ser por julgar a minha irmã apenas porque não opinava como eu.
 Anos mais tarde, ao procurar uns documentos dos meus pais, encontrei uma folha dobrada no fundo de uma gaveta. Era uma carta de Jess. - Nathan abanou a cabeça lentamente - Entre outras coisas, relatava que num domingo depois da sessão da tarde, os "amigos" a tinham encurralado nas casas de banho do cinema, despiram-na e riram-se dela. Apenas não tinha sido violada nesse dia porque o segurança apareceu.
- Pobre Jess, não me admira que não queira falar do passado.
- Quando vi a data nem queria acreditar. Datava do mês anterior à sua saída de casa. Fiquei devastado. A minha irmã precisou de mim e eu não a quis ouvir. Tentei encontrá-la mas na universidade não sabiam para onde se tinha mudado. No ano passado recebi uma carta dela. Queria antes de mais arrumar o passado. Nela dizia que nunca me chamaria por um nome que ela associava à dor e que sabia que eu tentava falar com ela, mas visto ir casar com Lori, pedia para não a procurar, ela era mais feliz sem laços que lhe recordassem o passado. Ao reler a carta as coisas pareciam encaixar como peças de puzzle. A recusa dela em chamar-me Nathan, o desejo de sair da cidade onde crescemos... Tudo encaixava. - Nathan olhou-a e Caterine viu neles o brilho das lágrimas - O meu avô chamava-se Nathan. Entendes?! Ela recusava-se a chamar-me pelo mesmo nome do homem que tanto a tinha magoado. Assim como se recusava a viver numa cidade onde olhavam para ela como se fosse um bicho raro.
- Pobre Jess!
- Consegues imaginar o que ela sentiu?! Imaginei-a nua, no chão, com todos a rirem-se dela! Desejei voltar atrás no tempo, dizer-lhe que acreditava nela, que podia contar comigo...
- Todos cometemos erros.
- Uns mais que outros. Levei muito tempo para me perdoar a mim mesmo. Por isso quando me disseste que não havia gravidez para acompanhar pensei que estava a receber o castigo pelo que tinha feito.
- Desculpa. Não pretendia... Foi tudo tão repentino. Descobrir que eras irmão de Jess e depois que estava grávida.
- E sem me deixares explicar, decidiste afastar-me da tua vida e da vida dessa criança.
- Estava magoada.
- Estavas...  - Nathan puxou-a para mais perto - Amo-te tanto! Não sei o que me mais me doeu, saber que tinha perdido o meu filho ou saber que me odiavas tanto que te negavas a ter um filho meu.
- Não te odeio. Amo-te. Por isso me doeu perceber que me tinhas mentido. - Caterine colocou um dedo nos lábios dele ao perceber que ele ia falar - Agora sei que não o fizeste. Mas pensei que sim.
- Por causa daquele idiota com quem namoraste! Jess falou-me dele. Sabes que senti ciúmes?!
- Ciúmes?!  Porquê? Não tenho nada com Barry à imenso tempo.
- Mas estiveste com ele! Comecei a pensar que poderias ir procurar conforto nos braços...

Foi a vez de Caterine o calar com um beijo. Nathan apertou-a contra ele e o beijo ficou mais exigente e profundo. Caterine gemia quando tomou consciência do local onde estava.

- Nathan! Pára. Estamos em casa da tua irmã.
- É verdade, e isso lembrou-me uma coisa.
- O quê?
- Que temos de procurar uma casa condigna para criarmos os nossos filhos.
- Nossos filhos?!
- Sim, devo avisar que pretendo ter uns três ou quatro?
- E se forem gémeos?!
- São gémeos!? - Nathan colocou a mão na barriga dela.
- Não. É apenas um.
- Graças a Deus! Acho que para uma primeira vez chega perfeitamente.


Dois anos depois Jess e Nathan corriam atrás de Daisy e Vance enquanto Caterine e Lori observavam sentadas num banco próximo.

- Não sei quem é mais criança. - Lori sorriu ao ver Jess cair na relva.
- Acho que os adultos.
- Concordo.
- Harry... desculpa, Nathan e Jess parecem ter esquecido o passado.
- As crianças contribuíram para isso.
- E dentro de pouco mais uma contribuirá.
- Como soubeste? Pedi a Nathan para não...
- Estás grávida?!
- Não era disso que estavas a falar?
- Não! Estava a falar da irmã de Daisy. Já aprovaram o pedido de adopção.
- Parabéns! - Caterine abraçou Lori - Oh deus... Acho que vou chorar.
- Outra vez?! Espero que isso não seja sinal de mais um menino!
- Que se passa aqui? - Nathan aproximou-se delas - Estás a chorar?
- Oh cala-te! - Caterine sorria ao mesmo tempo que as lágrimas escorria pelo rosto.
- Vou ver o lago... - Lori deixou-os a sós.
- Sabes que te amo?!
- Mesmo a chorar?!
- A chorar, a rir, vou amar-te sempre.





                         FIM




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