DE VOLTA AO PASSADO 2º PARTE
Leonor observava Afonso sentado na esplanada. Os anos transformaram-no num homem vistoso.
Nada que ela não esperasse, afinal já nos tempos da faculdade ele tinha os traços de um deus grego, e embora fosse mais novo que ela 5 anos, sempre soubera o que queria da vida e ela fazia parte dos desejos dele. Ela lutou contra isso, Deus sabe como ela lutou...
Olhava a montra de vidro como se não existisse e perdeu-se no tempo...
Leonor conseguira trabalho no bar de uma amiga da sua tia, após ter discutido mais uma vez com os seus pais, que queriam casa-la com o filho do patrão do seu pai. Tinha que fugir daquela situação fosse como fosse! Percebia que apenas quisessem o melhor para ela, mas casar sem amor não estava nos seus planos. Se soubesse o que o destino lhe reservava...
Acabou convencendo os pais a deixarem-na ir para Lisboa por uns tempos, mais concretamente por 2 anos, para pensar bem no que queria, prometendo vir cada 15 dias a casa no mínimo.
Depois de falar com a tia, que romântica como ela apoiara a sobrinha naquela decisão, embora os pais achassem que estavam as duas loucas, rumou até à capital num dia frio do mês de Novembro.
A amiga da sua tia, colocou-a atender no bar que tinha perto da faculdade. Depressa fez amizade entre as raparigas, que muitas vezes lhe pediam concelho e não era indiferente aos rapazes, sabia bem que comentavam a cor dos seus olhos verdes, o seu cabelo sedoso e ondulado, o seu corpo torneado... Enfim, era a atração do momento e isso reflectiu-se na afluência ao bar.
Era frequente ouvir piropos, principalmente à noite, quando os universitários bebiam umas cervejas a mais, aos mais atrevidos bastava dizer-lhes que tinha 25 anos e tudo parava por ali.
Era velha demais para eles!
Mas para Afonso isso não foi impedimento, todas as tardes ia até lá e metia conversa com ela. Nunca lhe dera esperanças, apenas falavam. Embora ela continua-se a recusar os convites dele para sair.
Numa tarde antes da última semana de aulas entrou no bar.
- Hoje não tens desculpa, o bar está vazio. Por isso podes sair mais cedo e assim podemos ir ao cinema, jantar...não necessariamente por esta ordem.
- Já te disse que não. Tens montes de raparigas a teus pés...
-E eu já te disse que não quero nenhuma rapariga. Estou farto de miúdas. Quero uma mulher, quero-te a ti. E não desisto...
-Porque insistes tanto? Sou mais velha que tu, tens é de procurar as miúdas da tua idade. Vais ver que te vai passar essa paixoneta.
-Se tens tanta certeza que vai ser assim, porque não fazer-me a vontade? Para a semana vou para casa e se quando voltar esta paixoneta, como tu dizes, já não existir ficamos amigos. Combinado?
Acabou aceitando, afinal gostava de falar com ele. E precisava de um verdadeiro amigo.
Durante o jantar falaram de tudo um pouco, tinham os mesmos interesses. Adoravam ler, embora literatura diferente, os passeios junto ao mar também eram os seus favoritos. Adoravam animais, viajar...
Leonor surpreendendo-se por terem tantas coisas em comum. E surpreendeu-se ainda mais quando as saídas se prolongaram durante o resto da semana. Já não inventava desculpas para não o ver. Gostava da sua companhia.
No dia em que ela tinha de ir a casa, ele levou-a à estação. Ele também partiria nessa tarde, e estariam 15 dias sem se ver.
A chamada dos passageiros foi feita, e insistiu em acompanha-la até ao comboio. E foi ali que deram o primeiro beijo...ela chegou-se a ele com a ideia de lhe dar um beijo na face, mas ele fez-lhe uma caricia ao de leve no pescoço e com a outra mão eliminou o pouco espaço que havia entre ambos.
As bocas tocaram-se primeiro a medo depois num beijo sôfrego como se quisessem absorver um pouco um do outro. As línguas entrelaçaram-se e ela gemeu...Já tinha sido beijada, mas nunca assim... Nunca sentira nada que se aproxima-se do que estava a sentir. Sentia o coração a bater descompassado.
Quando se separam tinha os olhos brilhantes pelas lágrimas
-Foi assim tão mau?- perguntou ele
-Mau? Não, nada disso
-Ufa! Eu a pensar que tinha estragado tudo... não... deixa para lá. Então porque estás quase a chorar?
- Percebi que... - calou-se com medo de dizer o que sentia
Como quem compreende o que ela estava a sentir ele disse-lhe:
-Eu também vou ter saudades tuas...
A viagem parecia interminável assim como o fim de semana. E ainda lhe faltavam 15 dias de solidão após a chegada a Lisboa...
O ritmo do bar estava calmo com os estudantes em ferias. Um dia estava a arrumar para fechar o bar a porta abriu-se...
-Desculpe mas vou... - calou-se ao ver Afonso, não podia acreditar.Estava ali.
-Pensei que...- calou-se pois ela atirou-se nos seus braços e beijaram-se eliminando as saudades que os consumia por dentro.
-Estás aqui... mas ainda estás de férias...
-Parece que a paixoneta não acabou.
Beijou-a como se quisesse provar o que dizia.
A porta da livraria voltou a abrir-se acabando com aquelas doces recordações. Estava quase na hora do almoço, hora em que as pessoas aproveitavam para comprar a revista habitual ou apanhar o livro que tinham encomendado. Não teve tempo de pensar em mais nada.
Afonso apareceu quando faltavam 2 minutos para a uma, como se temesse que ela faltasse ao encontro.
-Precisas de ajuda?
-Não, sempre fiz...- calou-se pois percebeu que estava a ser mal educada -Desculpa acabou por dizer.
-Que aconteceu à mulher alegre que conheci?
-Cresceu...
-Eu também cresci mas não azedei -disse tentando aliviar o momento
-Pois, já percebi.
Sentaram-se na esplanada e pediram umas sandes. Comeram em silêncio.
-Começas tu ou eu?- perguntou-lhe Afonso
-Começar?! Não percebo...
-Vejo que estás casada...
- Parece que sim.
-Não és feliz?
-E tu, casaste?- perguntou tentando evitar a pergunta.
-Sim casei. Depois de me formar, mas já me divorciei há alguns anos.
-Sinto muito.
-Porquê?! Eu não. Não há nada mais triste que viver uma vida de mentiras.
Leonor calou-se, sabia ser verdade mas existem coisas das quais não se pode fugir, muito menos quando não se tem para onde.
Acabaram por falar de coisas menos comprometedoras o resto do tempo, como se estivessem a conhecer-se naquele instante. Num desses momentos Leonor esqueceu-se de tudo e até riu, como não ria à muito.
Estavam tão concentrados neles mesmos, que quando uma jovem lhe colocou a mão no ombro para lhe perguntar se não abria a livraria, ela pulou na cadeira como se levasse um choque.
Pediu desculpa à rapariga e foi com ela abrir a livraria deixando Afonso muito intrigado com tudo aquilo.
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