sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

DE VOLTA AO PASSADO 5º PARTE





Passaram 5 dias sem qualquer noticia de Afonso. Leonor, que começava a acreditar que ele apenas a tinha procurado para ter a certeza que tinha seguido em frente com a sua vida, levou um susto quando um Afonso irado entrou na livraria fechando a porta e colocando o cartaz de volto já!

-Como é que consegues viver assim?! -Afonso estava mesmo zangado, o seu segredo fora descoberto como é que ele sabia? - Olha que não me costumo exasperar mas ontem apeteceu-me aparecer e partir a cara daquele filho da p...
-Do que estás a falar?-perguntou tentando perceber o que queria dizer.
- Pelo amor de Deus! Não o defendas! Nunca pensei que pudesse odiar alguém! Como aguentas isto e porquê é que não entendo.
-As coisas não são assim tão simples.
-Claro que são! Não tens de aturar isto... Sei que tiveste de aturar muito em tempos, mas pensei que tinhas resolvido isso à muito! Tens sempre opção, podes fazer queixa ou deixá-lo. Não..
-E depois?! Do que vivia? Não tenho ninguém a quem...

Leonor começou a chorar o que destroçou Afonso que não suportava vê-la assim.

-E quem pensas que és para aparecer assim depois de tantos anos ? Exigindo satisfações da minha vida?- o chorou aumentou de intensidade - não tens esse...

O chorou impediu-a de continuar a falar.

-Desculpa! Não queria intrometer-me, mas não consigo voltar a cara para o lado como se nada se passasse. Não chores por favor.

Abraçou-a como o tinha feito à muito tempo e desejou ter insistido em encontrá-la quando regressou a Portugal. Os anos tinham passado e ainda a amava! Tê-la nos seus braços novamente era o realizar de um sonho. Agora conseguia ver com claridade o que sentia por ela. Pensava que o desejo de saber dela era simples curiosidade, mas não. Amava-a como nunca. Acariciou-lhe as faces molhadas e beijou-lhe os olhos. O coração de Leonor começou a bater desgovernado juntamente com o de Afonso.

-Não... não podemos!
-Psiu!-disse ele entre beijos- Minha doce Leonor!

Leonor acabou rendendo-se aos beijos que se estenderam até à sua boca.

-Desculpa.. não posso...-Leonor afastou-se, lutando contra o desejo de ficar ali nos seus braços para sempre. Se pudesse voltar atrás...- não entendes, não fui criada assim.
-Eu sei...desculpa,  afasto-me, por ti, não por ele. Ele não merece o teu respeito, quanto mais o teu carinho. Diz-me porquê! Preciso de saber, porquê?
-Porquê,o quê?
-Isto tudo, não entendo, trabalhas, não tens filhos. Não entendo a razão de te submeteres a este idiota.

Leonor sorriu, não sabia da existência de Maria.

-Ainda sorris... não me digas que és como aquelas mulheres que acham que merecem os socos que os maridos lhes dão.
-O Rui nunca me bateu...
-Isso não é desculpa! Esses insultos todos. Maltrata-te psicologicamente... penso que não deve de fazer muito diferença. Ou será que não sofres com o que te diz?
- Claro que sofro! Mas tenho de pagar pelas escolhas que fiz no passado!- rematou como se isso justificasse os ataques verbais do marido.
- Parece que ainda te sentes obrigada a muita coisas... os anos passaram sabes? -olhava para ela tentando ver nos seus olhos o que lhe ia na alma, o que ela tentava esconder- Ou ainda achas que deves algo aos teus pais? Sentes que te deves castigar por algo?
- Tem dias em que acho que sim!- encolheu os ombros como se estivesse resignada- Como soubeste? Quem te contou? - perguntou enquanto corria a persiana da vitrina.

Preferia que pensassem que não estava, a arriscar-se que o marido descobrisse que estava trancada na livraria com um homem.

-Não foi difícil, bastou perguntar na vizinhança. As pessoas mais idosas tendem a abrir-se com estranhos. Principalmente se estão sozinhas.
- Não percebo, nunca contei a ninguém...
- Nem precisas. A vizinha de cima diz que os gritos dele ouvem-se como se estivesse na casa dela. Quero...- Afonso calou-se, tentava encontrar as palavras mais indicadas para exprimir o que queria- Não, não quero! Será mais apropriado dizer que preciso entender o porquê!
- Preciso dele, essa é que é a verdade, triste, mas verdade! Não tenho como pagar uma renda de casa, quanto mais comprar uma. A livraria permite-me ter algum dinheiro, mas depois de pagar a letra ao banco não tenho o suficiente para viver! Mesmo que considera-se vender a livraria com a idade que tenho onde vou arranjar emprego?
-Como letra ao banco? Não estou a perceber.- nesse instante uma carrinha parou à porta. Leonor ficou branca como a cal.
-Por favor vai lá para trás. Não posso...- a buzina da carrinha ecoou na praça. -Tenho de abrir é o senhor das revistas e é amigo do meu marido. Por favor!- o medo estava estampado nos seus olhos.

Afonso acabou indo para as traseiras da livraria como ela lhe pedia.

-Desculpe Sr. Manuel. mas estava na casa de banho. Não sei que tenho hoje!-disse a jeito de desculpa
-A minha mulher anda igual, veja lá se não é alguma virose. Andam aí! A minha neta veio assim da escola e pegou-lha. Ainda bem que eu me escapei. -E começou a rir- Já imaginou eu parando em plena autoestrada para me aliviar?! E aquela gente toda a ver? Devia de ser bonito devia! Já me esquecia, estão aqui estas revistas, a ver se o pessoal lhe pega. É daquelas que vocês mulheres gostam, com muitos testes. Se não as vender para a semana levo-as. Esta minha cabeça, a minha mulher pediu para lhe perguntar pela sua Maria, sabe, estamos a pensar mandar a nossa Mafalda para o estrangeiro mas temos algum receio.
-Ela gosta muito. Esta a fazer o que gosta.- tentou evitar mais conversa.
-Imagino que sim. Mas ela tem sorte, tem lá o tio, nós não temos ninguém, nem em Itália nem em lado nenhum. Mas ela quer aproveitar esta coisa do Erasmus ou lá o que é! Esta juventude. Já imaginou a gente na nossa mocidade dizer aos pais que queríamos ir estudar para fora? Caía o Carmo e a Trindade! Mas ainda bem que os tempos mudaram.-e foi caminhando para a carrinha.- até para a semana, cumprimentos lá em casa.
-Serão entregues. Obrigada, dê beijinhos à Carminda.

Leonor ficou na porta esperando que ele partisse.
Fechou novamente a porta, se Afonso ouviu a conversa sabia que tinha muita coisa a explicar.  Mas não queria que fosse ali, não assim.

- Maria?-como ela continuava calada continuou- Sabes não é preciso ser nenhum génio para perceber. Porque não me contaste que tens uma filha?
- Porque não ando por aí dizendo:Sabem tenho uma filha! -tinha de pensar como lhe dizer- Desculpa! Mas isto tudo é muita coisa junta. Voltaste assim do nada, passados estes anos todos. Que queres?
-O mesmo que queria à 20 anos atrás! Quero-te a ti!
-Esqueceste que estou casada!
-E tu sabias que já se inventou o divorcio à muito tempo?
-Não brinques com isto! -disse, tentando não pensar nas implicações que aquilo trazia- O que se passou passou, nada muda.
-Não estou a brincar, quando voltei a Lisboa e não te encontrei pensei que ia dar em louco. Com grande dificuldade consegui que a tua tia me desse a tua morada no norte. Mas disse-me que já tinhas decidido a tua vida. Ainda me meti no comboio mas sai a meio caminho. Tinhas escolhido o teu caminho, quem era eu para aparecer assim pedindo que me amasses como eu te amava?! Se soubesse... Nem sonhas a vontade que tenho de lhe partir a cara! Vem comigo.- pediu agarrando-lhe a mão.
- Não posso...
-Claro que podes. Não quero deixar de te ver. E não consigo dormir sabendo que vais ter com aquele monstro.
- Se fosse assim tão simples.
-Dizes isso pela tua filha? Quantos anos tem?
-Fez 19...- calou-se.
-Já é uma mulherzinha, de certeza que prefere que sejas feliz. Ou foi para não ver como é o pai que foi para casa do tio?
-Claro que não! Ela sabe perfeitamente como é o pai. Nunca lho escondi!

E ela estava a referir-se a ele, ao verdadeiro pai não ao seu marido. Tinha-lhe dado a única fotografia que tinha dele quando a filha quis saber como era o seu pai.

-Por isso mesmo...podemos começar de novo. Deixamos Lisboa ou até mesmo Portugal, a Maria pode vir viver connosco ou então visitar-nos sempre que quiser.
-Fazes tudo parecer tão simples tão fácil...
-E é! Tu é que estás a complicar tudo. Sei que ainda sentes algo por mim, se assim não fosse não me tinhas beijado como beijas-te.

Leonor olhou o relógio tentando evitar responder-lhe.

-Tenho de abrir a livraria, estou à imenso tempo com a porta fechada e daqui a pouco os estudantes...
-Não tentes evitar-me, pois não vais conseguir. Temos que falar e resolver esta situação não podes continuar com essa coisa a que chamas de marido.

Afonso saiu deixando Leonor com a cabeça a dar voltas e de coração acelerado.
Afonso disse que a amava. Não tinha sonhado. Ele ainda a amava. Assim como ela o amava.
Mas se ainda a amava porque não voltou para Lisboa depois daquela discussão? Ela esperou quase um mês por ele e casou por não ter sinais dele. Pensava que ele se tinha cansado dela. Ele também casou, porquê?



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