quinta-feira, 25 de agosto de 2016

SOB A LUZ DA LUA 9ª PARTE




Duas semanas depois a casa estava terminada, Ana pediu a Clara que entrega-se a chave a Anette ou a Steve. Ela precisava de se afastar por uns dias.
E embora preferisse ir apanhar ar puro, desta vez não foi para a montanha, aquele lugar trazia-lhe muitas recordações. Preferiu aceitar a sugestão do pai e foi para o hotel de um amigo. No terceiro dia Clara ligou a comunicar que nem Anette nem Steve estavam em casa e os telemóveis não davam sinal. Ana pensou que estariam na cabana, lá a rede era muito fraca. Deu graças por ter decidido ir para a cidade! Imaginou que a esta hora estariam a ver o por do sol juntos, possivelmente na lagoa onde a levou a ver as cegonhas... ao lembrar esses dias, sentiu os olhos encherem-se de lágrimas. Atirou a revista para um canto e saiu. Estar ali sentada, a imaginar onde ele estaria e com quem, não era a melhor forma de se recuperar e muito menos de o esquecer!

Embora no mês de Março os dias fossem um pouco maiores, o dia estava a acabar, sentou-se no banco do parque e ficou a observar os pássaros que vinham comer as migalhas que estavam no chão.

- Ana?! - Mário olhava para ela como se visse um fantasma.- Que fazes aqui?!
- Olá Mário. Vim a trabalho e acabei por ficar uns dias. - Mentiu, não queria explicar-lhe o porque da sua estadia ali.
- A julgar pela tua cara bem precisas.
- De quê?!
- De uns dias de folga, estás mal encarada! - Sentou-se junto a ela - E que dizes da cidade?
- Gosto. Um pouco agitada demais para o meu gosto, mas tem coisas interessantes.
- Eu sei, preferes o campo. Mas aposto que ainda não foste ao Sky
- Sky?!
- Um restaurante, é de um amigo meu. Vamos? Prometo que vais gostar.

Mário sorria para ela, Ana hesitou, mas acabou por aceitar. Talvez a companhia dele a fizesse esquecer Steve, nem que fosse por umas horas.

- Que tens feito? Além de trabalhar. - Mário mantinha uma certa formalidade entre eles, o que a fez lembrar o tempo em que começou a namorar com ele.
- Queres saber se tenho alguém?! - Ana sorriu ao ver o ar atrapalhado dele - Neste momento não, mas não estou interessada numa relação.
- E numa amizade?
- Esses são sempre bem vindos.

Jantaram no Sky, um dos restaurantes do momento, elegante e sofisticado, bem ao gosto de Mário. No fim do jantar foram até ao hotel dela a pé, Ana teve de concordar que se divertiu com ele, até pensou pouco em Steve! Mas foi completamente impossível afastá-lo da sua mente, quando a lua brilhou no céu, o que lhe deixou um nó na garganta. Permaneceu calada durante o resto do caminho até ao hotel, deixando que Mário falasse de como estava a ser bem sucedido.
Quando a deixou no hotel, tentou dar-lhe um beijo, mas ela colocou uma mão no peito dele e deu-lhe um beijo na face. Mário sorriu e despediu-se.

Na manhã seguinte resolveu voltar para casa, Clara já devia de ter entregue a chave e ela não podia ficar ali para o resto da vida! Estar longe não tornava as coisas mais fáceis e precisava de trabalhar. Talvez ele tivesse desistido dela, certamente teria outras mulheres interessadas nele, mulheres que, ao contrário dela, não se importavam se ele era ou não casado!

Mal chegou a casa, foi directo para a ART fou YOU, Clara nem queria acreditar quando a viu.

- Ao menos podias ter avisado que vinhas! - Clara abraçou a amiga.
- E perder a oportunidade de te surpreender?! Nunca! Como está tudo por aqui?
- Bem.

Clara nem deixou Ana entrar no escritório, colocou-a ali mesmo ao corrente do trabalho que tinham em mãos.

- Não sei se vais dar conseguir fazer tudo, é muito trabalho mas elas insistiram em que fosses tu a organizar tudo... Agendei-te para o mês que vem dois casamentos. E temos um pedido especial, uma despedida de solteira.
- Uma despedida de solteira?! Mas que querem que faça?
- Sabe-se lá! - Clara estendeu-lhe a agenda dela - Como estás? Não me pareces mais animada...
- Percebi que certas coisas não passam com a distância. Não adianta fugir, elas perseguem-te e assombram-te como um fantasma.
- Realmente pareces mais viva quando estás a trabalhar! Mas voltas-te muito melancólica! - Clara olhou  a amiga - Por falar em melancolia, Anette vem apanhar a chave hoje. Mas vou dizer que ainda não regressaste.
- Não. Deixa estar. Se ela quiser falar comigo estarei no escritório. Afinal tenho algum trabalho em atraso.

Clara viu Ana entrar no escritório e fechar a porta. Notou que a amiga estava triste e abatida. Era visível o esforço que fazia para se mostrar alegre. Estes dias fora, não foram suficientes para a amiga recuperar.

Ana sentou-se na cadeira e respirou fundo antes de começar a trabalhar. Algumas horas depois tinha o trabalho em dia, agarrou a agenda e esticou o canto da mesma, tinha ficado danificado no dia em que quase acertava em Steve. Podia comprar outra, mas achou que ter algo que lhe recorda-se o sacana que ele podia ser iria ajudá-la a esquecê-lo. Percebeu que não era assim tão simples!

- Posso? - Anette espreitou pela porta - Clara disse que já tinhas regressado.
- Sim, entra. Como estás? - Ana forçou um sorriso - Não queres sentar-te?
- Obrigada. Queria falar contigo, tens um tempo livre?
- Claro. Há algo que não seja do teu agrado?
- Na casa?! Oh não, está tudo lindo. Parece outra. Mais alegre, ganhou uma nova vida.
- Então?!
- Podemos ir beber um café !? - Anette olhava para ela com olhos suplicantes.
- Vou pedir que...

Anette segurou Ana pelo braço quando esta ia passar.

- Não. Queria ir a um sitio onde pudéssemos estar sozinhas, onde não fossemos interrompidas.

O coração de Ana disparou, nem quando Steve a beijou na primeira vez ele bateu tão furiosamente.

- Aqui temos toda a...
- Por favor, não te demoro. - Anette olhou-a tristemente. Como negar-lhe esse pedido?!
- Está bem. Aqui perto há uma pastelaria sossegada. Podemos falar lá.

Depois de avisar Clara partiram, mantiveram-se todo o trajecto em silêncio. Ela pensava em como se desculpar quando fosse confrontada com a traição, pois só podia ser isso que Anette queria esclarecer, talvez Anette pensa-se como a confrontar sem fazer um escândalo. Não lhe parecia ser o tipo de mulher que desata aos gritos em plena rua, chamando a atenção sobre si!
Quando entraram na pastelaria, Ana pediu dois chás e sentaram-se numa mesa afastada da porta, junto à janela.

Começaram a beber o chá olhando uma para a outra, como se se medissem mutuamente. Foi Anette que quebrou o silêncio.

- Nem sei como começar. Steve foi o melhor homem que conheci. Com um coração maior que ele! Acreditas que neste momento está com um amigo a ajudar na reconstrução de uma escola?! - Anette fez uma pausa e rodou a chávena na mesa - Conhecemos-nos quando eu tinha 8 anos, ele tinha apenas 5. Parece que ainda o vejo, a chegar à escola, tão pequeno e frágil, com aqueles olhos verdes cheios de medo. Durante uns dias tive de o defender, mas depressa aprendeu! Simpatizei logo com ele, já naquela altura era um doce de menino, doce e gentil. Exactamente como é hoje. Embora hoje seja um homem, e que homem! - Anette sorriu, e ela sentiu o coração encolher - Sempre esteve do meu lado, nos bons e nos maus momentos  - Ana olhava para ela sem perceber bem o que ela pretendia com aquela conversa - Existem coisas que ele não gosta de falar, que apesar de o magoarem, guarda só para si. Tem alguns fantasmas, quem não?! Nem a mim me conta tudo o que o preocupa e magoa. E para que não dê em louco precisa de um escape... sei disso e compreendo.
- Anette eu...
- Deixa-me terminar, por favor. - Anette colocou a mão na dela
- Embora não as conheci todas, sei que teve muitas mulheres - Voltou a sorrir. - O que não me admira!
- Eu não vejo o que...
- Sei que não lhe és indiferente e tu também sentes algo por ele. O que é normal!

 Aquelas palavras deixaram Ana boquiaberta, como podia dizer aquilo tão levianamente?! Como se fosse a coisa mais natural do mundo?! Não podia estar a ouvir bem, ela sabia que ele a traía e ainda achava normal?! Mas que se passava com ela?!

- Anette.- Ana começou, e como sempre quando ficava nervosa, começou e não parou - Desculpa, mas estás a confundir tudo. Peço desculpas por tudo o que se passou, não sabia que ele era... é casado. Assim que soube nunca mais estive com ele. Ninguém gosta de ser traída.  Acho tens de resolver essas coisas com o teu marido. Da minha parte prometo manter-me afastada.
- Mas Ana...
- Por favor. É melhor...

Com as lágrimas a caírem-lhe pelas faces Ana saiu para a rua, não queria ouvir nada mais. Amava-o sim, mas daí a aceitar um relacionamento a três... Não, não podia aceitar!

- Ela o quê?! - Clara estava tão admirada como ela - Nem acredito no que estou a ouvir! Se não fosses tu a contar-me!
- Sei que hoje em dia estas coisas são o mais comum, mas bolas! Eu não aceitava partilhar o meu marido! Ainda estou em estado de choque! Nem sei que diga. Felizmente ele está fora e não pode vir pressionar-me.
- Isso quer dizer que se ele te pressiona-se...
- Claro que não! Mas seria uma pressão psicológica muito grande! E é mais fácil resistir quando não se ama.
- Pelo menos tens tempo para arranjar um plano para te afastares dele. Onde está? Ou Anette não te disse?
- Ela disse que foi com um amigo ajudar a construir uma escola.
- Isso quer dizer que tem bom coração.
- Sim, mas isso não o justifica!
- As preferências de uma pessoa, neste caso as sexuais, nada têm que ver com o tipo de ser humano que é!
- Podes ter razão. Mas seria incapaz de dividir a minha vida com um homem assim! Nem percebo como ela suporta isso!
- E que pensas fazer se ele te procurar?
- Afastá-lo! É a única coisa a fazer. Jamais ajudaria a destruir um casamento de espontânea e livre vontade. Porque mais cedo ou mais tarde este casamento vai ruir.


Ana não parava um dia, entre a organização dos casamentos e a despedida de solteira, não tinha tempo para descansar devidamente. E o seu corpo mostrava sinais disso! No dia que terminava a decoração do salão para a despedida, foi apanhada desprevenida por uma trovoada, quando chegou ao carro estava completamente encharcada! Apesar de todos os cuidados, adoeceu. Estava na cama com febre à três dias e mesmo contrariada, não teve alternativa se não consultar um médico. Foi-lhe diagnosticada uma infecção respiratória. A meio do tratamento o internamento mostrava-se eminente. Como se negou, foi aconselhada a sair da cidade, ir para um sítio onde respira-se ar puro, onde estivesse afastada da poluição. Devia voltar passados 7 dias, se não mostra-se melhoras até aí, apesar dos protestos, teria de ser internada!

Prometendo cuidar-se e levando Maria por companhia voltou à cabana.
A recuperação mostrava-se lenta, mas estava com melhor cor. E para alegria de Maria começava a mostrar mais apetite. Até já tinha recuperado algum peso. No último dia regressou ao hospital para ir à consulta. Para sua surpresa a infecção tinha diminuído. O médico aconselhou-a, se possível, permanecer mais uns dias na cabana. O ar da mata fazia-lhe bem e quando estivesse totalmente recuperada podia voltar à cidade.

Passaram em casa para apanhar mais roupa, Ana tentava persuadir Maria a ficar. Estava a desfrutar da estadia na cabana e sentia que se desse tempo a si própria, podia curar lá as suas feridas. Mas para isso precisava de estar sozinha.

- Não tens porque voltar, posso cuidar de mim sozinha. Afinal já consigo cozinhar.
- Mesmo assim, eu vou. Não gosto que a menina vá sozinha... sabe-se lá o que pode acontecer!
- Pois... como tenho apenas cinco anos preciso de aia! Ai Maria, não sejas assim, tão mãe galinha. O meu pai precisa mais de ti que eu, estás a esquecer-te que deixas a casa nas mãos de um homem que apenas percebe de leis?! - Embora o seu pai soubesse cuidar-se sozinho, ela gostava de saber que Maria estava por perto.
- Acha que não sei?! Só come porcarias... se eu cá estivesse...
- Por isso está decidido, ficas e não se fala mais nisso. E como viste, Jil vai lá de dois em dois dias, se porventura precisar de ajuda prometo mandar chamar-te.
- Promete?!
- Claro. - Ana deu um beijo nas faces coradas de Maria - Prometo fazer tudo direitinho.


Com o passar dos dias Ana aprendeu a lidar com os sentimentos que sentia por Steve,  havia coisas que estavam bem resolvidas e ela entendia que se estavam resolvidas era meio caminho andado para as esquecer, ou para a magoarem menos! O primeiro ponto e mais doloroso era o facto de o amar! Já se resignara, quanto a isso não podia fazer nada, mas também não seria a última mulher a amar um homem que não pode ter! " Que não queres ter " ouviu a sua consciência dizer. Fosse como fosse, se ele não podia ser inteiramente dela, preferia não tê-lo!  Já conseguia passar o dia sem pensar nele constantemente, ainda lhe restava conseguir olhar a lua sem que o seu coração dispara-se! Mas com o tempo chegava lá.
Tinha passado estes dois dias sozinha e começava a apreciar a natureza sem choros, sem que cada folha, cada brisa ou ave lhe trouxesse a recordação dele. A noite era o maior desafio, aí sim, era impotente perante tanto fantasma, assombravam-na os beijos dele, as caricias, a sua voz, a respiração dele no seu pescoço... as recordações tendiam a voltar cada vez mais fortes!

O sol brilhava no horizonte, os pássaros cantavam e os "tiros" da mota de Jil ouviam-se ao longe e ela dava de comer a um pato que por ali aparecia todas as manhãs e com quem se habituou a falar.

- Ora bem. Um...dois...três...quatro...cinco... - Ana contava cada "tiro" tentando perceber a que distância ele estava, na última vez enganou-se por pouco - ...Sete. Três cabanas se não me engano!

Atirou o resto do pão para o chão e entrou para apanhar o saco para o pão. Jil não tardaria a chegar, Ana abriu a porta e não queria acreditar no que os seus olhos viam. Steve estava ali, à sua frente, de semblante abatido, com a barba por fazer, de sorriso forçado mas com o mesmo carisma com que a tinha seduzido naquele lugar.

- Que fazes aqui?!
- Venho cumprir o que te prometi.

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