domingo, 11 de dezembro de 2016

MEDO DE AMAR 8ª PARTE




 Bea levou uma mão até à cabeça, que latejava e fez um esforço para abrir os olhos. Jim olhava para ela de semblante carregado. Onde estava Max?! Lembrou-se então de Max a cair do cavalo, do seu corpo estendido no chão... A dor aumentou de intensidade, grossas lágrimas começaram a cair pelo seu rosto.

- Não fique assim. - Jim tentava consolá-la - São coisas que acontecem. O medico não tarda, tudo se vai resolver.

Como podia dizer-lhe que tudo se iria resolver?! Não era idiota, se ele estava ali, e tinham chamado o médico, Max não estava bem! A dor que ameaçava rebentar a sua cabeça, mudou-se para o seu peito. Entregou-se à dor e o choro tornou-se incontrolável.  Percebeu que amava Max! Foi preciso ele cair para ver isso. Precisava vê-lo! Tentou levantar-se, mas Jim segurou-a pelos ombros.

- Não se pode levantar. - A porta da entrada abriu-se e Jim parecia aliviado  - Ali está o médico.
- Devia de estar na cama. - O médico sentou-se no lugar que Jim desocupou - É normal desmaiar assim?!
- Ultimamente sim, mas já estou bem. Não era suposto estar a observar Max?! - Negava-se a pensar nas hipóteses que justificavam a presença dele ali - Certamente requer mais cuidados!
- Já o observei e nada mais posso fazer. Agora, deite-se...
- Como não pode fazer nada?! Quero vê-lo!

Com alguma agressividade desviou as mãos do médico e tentou levantar-se. Negava-se a permanecer ali, quando ele podia estar...

- Deixas Mathew observar-te?! - A voz de Max foi um alívio e ao mesmo tempo um tormento para ela.
- Max! - Levantou-se de um salto e correu para ele - Estás bem?! Vi-te cair... - As lágrimas voltaram a cair. - Pensei que...
- Foi só um susto, nada mais que isso. - Max beijou-lhe a testa - Vamos, deita-te e deixa Mathew observar-te.
- Ficas aqui?!
- Se ele permitir...
- Acho melhor esperares lá fora. - Mathew sorriu para Max antes de este sair - Prometo não demorar.

Bea sentou-se novamente e deixou-se observar, permaneceu calada enquanto ele a auscultava. Max nunca lhe comentou que conhecia o médico da povoação, parecia haver alguma cumplicidade entre eles. Mas isso agora era secundário, o importante era Max estar bem. Qualquer outra coisa, carecia de importância. A voz do médico chegou até ela lentamente, como uma neblina numa manhã de inverno.

- Está grávida?! Preciso que seja sincera. - Ele tamborilava com a caneta num bloco - Não posso fazer um...
- Claro que não! - Interrompeu-o abruptamente.
- Não precisa de ficar indignada. - Mathew tentou disfarçar um sorriso - Apenas tento averiguar as causas do desmaio.
- Não é a primeira vez que desmaio.
- Já o tinha mencionado. Por isso pedi a Maximillian que saísse. Assim pode ser sincera comigo, caso se encontra-se grávida quando veio para cá. Não quero causar problemas

Se assim fosse, César seria o pai! Arrepiou-se com a ideia, não se imaginava a ter um filho com César.

- Já cá estou à seis meses praticamente, se estivesse grávida, Max seria o pai! - Sentiu as faces ficarem vermelhas, ao perceber que gostava de ser a mãe dos filhos de Max-  Desde que vim para cá os desmaios pararam. Este foi o primeiro desde que cheguei.

Colocou Mathew ao corrente do que lhe disse o seu médico. Ele estava de acordo, podia ser cansaço. Mas neste caso, podia ser ansiedade e medo de perder alguém que amava. Antes de sair, deu-lhe um calmante e aconselhou-a a fazer uns exames o mais breve possível. Mas por agora devia de descansar.

Segundo o conselho de Mathew subiu para se deitar. Mas estava gelada, precisava tomar um duche para entrar em calor. abriu a torneira e começou a despir-se, Max entrou nesse instante.

- Tens de ter cuidado. - ele ajudou-a a tirar a camisola - Devias de aprofundar o que provoca esses desmaios.
- É apenas cansaço, nada mais. Mas ver-te cair não ajudou!
- Peço desculpa, não era minha intenção cair e muito menos assustar-te. - Max beijou-a - Promete que vais descansar.
- Não precisas de te preocupar. Estou bem, apenas gelada.
- Como não me vou preocupar com a pessoa que amo?! É completamente impossível.

Bea ficou sem saber que dizer.  Ele também tinha percebido que a amava agora?! Afinal, ela mesma acabara de descobrir que o amava! Devia de dizer que também o amava?! Fazer tal revelação era concordar com a sua submissão a ele! Não, isso não! Baixou a vista sem pronunciar uma palavra. Perante o silêncio dela, ele deixou-a sozinha.

Entrou no chuveiro, deixou a água relaxar o corpo. A dor que oprimia o seu peito ainda estava presente, sentiu necessidade de chorar. À muito tempo que não sentia tal necessidade. Deixou que as lágrimas corressem livremente, acabou sentada no chão, estremecendo. Sentiu-se mais aliviada depois de chorar.
O que ela tanto temera acabou por acontecer. Amava Max, do mesmo modo que a sua mãe amava o seu pai, e assim como ela, toda a sua vida seria absorvida por ele. Como pode apaixonar-se?! Era suposto ser apenas sexo, nada mais que isso! Apesar de saber que o amor destrói, deixou-se envolver na sua teia. Mais uns meses e seria apenas um apêndice dele, já não podia fugir, era tarde demais. Não! Não era... Saiu da cama e procurou a sua agenda.

Instantes depois regressou à cama, mais animada. Adormeceu pouco depois, mas o sono foi agitado pelo inúmeros sonhos que teve. Acordou com o peso de Max na cama, que tirava as botas. O quarto estava na penumbra, acendeu a luz.

- Já anoiteceu?! Devias de me ter acordado. - Observava Max como sempre, adorava vê-lo tirar a roupa, mas hoje algo era diferente, ele despia-se lentamente - Está tudo bem?!
- Sim, volta a dormir, precisas de descansar.

Quando Max se voltou a sentar na cama, um grito involuntário saiu da sua garganta. A medo levou a mão até ás costas dele, onde se começava a ver uma enorme mancha arroxeada.

- Meu Deus! - Retirou a mão quando ele se encolheu - Porque disseste que estavas bem?!
- Porque estou. É apenas um hematoma, vai passar.
- Mathew viu isso?! - Ela não conseguia desviar a vista do enorme hematoma. - Doí-te?
- Não mais que o meu orgulho!
- O teu orgulho pode bem... - Calou-se ao perceber que ele não se estava a referir à queda - Oh...
- Oh... - Max deitou-se junto a ela - Não precisas de dizer nada, posso vê-lo nos teus olhos. Mas sempre imaginei que quando chega-se a hora, ouviria, eu também! Enganei-me, não te vou pressionar, sei que me amas. Fui percebendo isso ao longo dos meses. Mas seria agradável ouvi-lo!
- Desculpa... - Bea ajeitou a cabeça no peito dele e ficou ali, como noutras  noites, ouvindo o bater do coração dele até adormecer.

Na manhã seguinte depois de Max sair, fez uma pequena mala com algumas coisas e deixou-lhe uma carta, a explicar que precisava de tempo, voltaria quando estivesse preparada para amar.  Mas não revelou que esse dia nunca chegaria. Não se ia render ao amor! Não estava disposta a sofrer pelo simples facto de amar um homem! Soube, desde o primeiro dia que o viu, que ele traria problemas a qualquer mulher que o deixa-se entrar na sua vida, mas não imaginava que essa mulher seria ela! Por isso, por muito que isso a fizesse sofrer, ia partir! Estava decidida, recomeçaria a sua vida numa outra cidade. Aceitou o convite que um antigo colega de escola lhe tinha feito antes da morte de Eme. Precisava de alguém como ela para liderar a sua equipa de designers! Na altura recusou o convite, tinha inaugurado a sua joalheria à pouco tempo e estava a dar-se bem. Mas agora precisava de um novo desafio, e era isso que estava a explicar a Ryana.

- Não acredito que vais fugir!- Ryana estava admirada com a atitude da amiga. - E o que te leva a acreditar que Gio ainda precisa de ti?! Pode já...
- Falei com ele ontem à tarde - Bea interrompeu a amiga - Por favor, entende. Preciso de me afastar.
- Tu não precisas de te afastar, queres fugir! Tens medo de amar e ser amada. Compreendo que tenhas algum receio, mas já não és uma adolescente! A tua mãe era uma pessoa completamente dependente do teu pai, não tinha vida própria, nem interesses que não envolvessem o teu pai! Tu não és assim!
- Sabes que não é só a minha mãe! Tu também não foste feliz, nem eu fui! E as pessoas que conhecemos e se separaram?! Queres que me entregue a Max para quê?! Para quando se cansar de mim, diga o mesmo que Mike?! Não preciso que me diga que tenho desejos e que não os consegue satisfazer.
- Vamos por partes, não acredito que compares Max ao meu ex! Ele foi um cobarde que não aceitou a diferença do filho, mas Max?! Tu mesma viste como ele tratou Frank! Nunca o tratou de forma diferente, sempre foi carinhosos e atencioso com ele, não havia ali nada que não fosse sincero! E quanto a Mike, que queres que te diga?! Tu mesma disseste que se calhar hoje não olharias para ele duas vezes! Na altura apaixonaste-te mas eras uma adolescente, estavas a despertar para a sexualidade! Acho que fazes mal em partir.
- Tenho de o fazer. Sei que vais cuidar de tudo. Vou enviar novos desenhos para que o atelier continue a funcionar.
- E o teu projecto com o acampamento?! Vais desistir?!
- Não, tenho as enfermeiras contratadas e os monitores, assim como uma cozinheira e a auxiliar. Assim que estiver tudo pronto a avançar o meu advogado trata de tudo. Deixei uma procuração a Max para cuidar da herdade.
- Ou seja, deixas tudo o que é teu nas mãos de outras pessoas e vais desaparecer! Não te consigo dissuadir?!
- Sabes que não.

Ryana abraçou a amiga fortemente. Pouco depois as duas choravam. Ryana levou-a ao aeroporto, ficou encarregue de trazer de volta o carro dela.

- Tens a certeza que é isto que queres?! - Ryana voltou a abraçar a amiga, enquanto se ouvia a última chamada para o voo.
- A única coisa, da qual tenho a certeza, é que não quero sofrer.
- E deixares Max vai fazer-te mais feliz?!
- Não sei.
- Vou sentir a tua falta.
- Eu também.

Uma hora depois Bea entrava nos escritórios de Gio.

- Boa tarde, Gio espera-me.
- Menina?! - A secretária olhou-a de cima a baixo.
- Beatrice.

Mas não precisou de ser anunciada pela secretária, um homem de estatura alta, com cabelos loiros apareceu por uma porta lateral.

- Bea! - Abraçou-a e deu-lhe um breve beijo nos lábios - Estava à tua espera. Entra. Temos muito que falar.
- Continuas na mesma! Não abrandas nunca?!
- Tempo é dinheiro. E olha quem fala?! Se bem me lembro eras igual. Algo te fez mudar?!
- Não. - Ela sorriu- Tens razão, sou como tu.
- Por isso não percebi porque resististe às minhas investidas. - Gio piscou o olho - Sabes que nunca encontrei ninguém como tu.
- Como eu?! - Bea soltou uma gargalhada - Nunca tivemos nada. Como sabes que não encontraste ninguém?!
- Tens razão! - Ele juntou-se a ela na gargalhada.- Bem, vamos ao que interessa.

Durante o resto da tarde Bea conseguiu afastar Max dos seus pensamentos. Gio era muito exigente com os seus colaboradores, o facto de terem feito a faculdade juntos não alterava isso. Nem a paixão que teve por ela no último ano, o fazia ser mais brando.
Agradecia a Gio esse facto, ele mantinha-a ocupada a maior parte do tempo, o que evitava que pensasse em Max e no muito que sentia a sua falta. O ritmo do trabalho era alucinante,  sabia a que horas iniciava o trabalho, mas a hora de saída, essa era uma completa incógnita. Gostava de trabalhar para Gio, mas tinha dias em que ela tinha saudades da herdade. E principalmente de Max. Passava a maior parte das noites acordada a pensar nele,  o que fazia as noites parecerem enormes. Sentia saudades do bater do coração dele debaixo da sua mão, de dormir no seu peito... Adormecia de madrugada e quase sempre a chorar.

Duas semanas depois de estar a trabalhar com Gio este convidou-a para jantar. Primeiro recusou, mas com a avançar do dia, as recordações das últimas noites ameaçavam repetir-se, sabia que seria mais uma noite a chorar por Max. Tentando evitar isso, antes do fim da tarde aceitou o convite.
Gio levou-a a casa e esperou que ela se vestisse, não tinha vontade de se arrumar, e muito menos de sair, mas tinha de fazer um esforço para se divertir. Precisava de pensar em algo que não fosse Max e Gio sempre soube como a fazer rir.
Escolheu um vestido azul de meia manga e uns sapatos de salto alto. Apanhou o cabelo e colocou um pouco de cor nos lábios e nos olhos. Disfarçou as olheiras e colocou um pouco de perfume nos pulsos. Olhou-se a espelho, estava elegante, mas não a ponto de lhe dar esperanças de que no fim da noite acabavam na mesma cama.

Gio levou-a a jantar ao apartamento dele, com a desculpa de que aceitou o convite dele tarde demais.
Bebiam um martini na varanda ao som de Frank Sinatra, Gio adorava Frank Sinatra.

- Lembras-te quando saltamos a aula de física para ir ao cinema?! - Gio falava alegremente sobre o passado - Se bem me lembro a ideia foi de Liz.
- Sim, foi.
- Ainda terá o cabelo lilás?! - A gargalhada contagiou Bea - Teria piada.
- Espero que não! Nunca percebi porque o pintava dessa cor.
- Para enfrentar o pai!  Ela odiava-o! Não sabias?!
- Pensei que se dessem bem!
- Não. Ela queria fugir de casa, ainda me pediu para fugir com ela. Mas eu estava preso a ti.
- Coisas da juventude.
- Nunca pensaste no que seria? - Gio aproximou-se dela e aprisionou-a entre ele e a varanda.
- Não. Sempre te vi como um irmão. - Manteve o olhar dele, reconheceu o olhar dele, desejava-a, talvez fosse isso que ela precisava para afastar Max dos seus pensamentos.
- Um irmão?! - Gio aproximou a boca da dela e voltou a afastar-se - E agora?
- Agora...

Ele não a deixou continuar, terminou com o pouco espaço que os separava e beijou-a. Sentiu os lábios dele na sua boca mas não sentiu absolutamente nada. Nem o desejo, que geralmente a consumia! Não reagiu ao beijo, deixou-se beijar, na esperança de recuperar o desejo de outros dias. Mas ele não voltou. Gio parou de a beijar.

- Sei quando não sou desejado. Vamos jantar? - Ele continuava o cavalheiro que ela recordava. - Ou não tens fome?
- Estou faminta - Mentiu, a sua cabeça não parava de pensar no que tinha acontecido. O que aconteceu ao desejo incontrolável que tinha?!

Durante o jantar recordaram os tempos de escola, e Bea falou-lhe da herdade e do projecto que tinha em mãos. De como as crianças, como o seu afilhado, são descuidadas pela sociedade. Sentia que aquele projecto fazia muita falta.

- O que aconteceu para deixares esse projecto? - Gio bebericava o café - Não costumavas render-te.
- Não me rendi.
- Parece. Sempre te imaginei como uma guerreira sem medo.
- Sem medo?! - Ela sorriu sem vontade - Se existem pessoas com medo, eu sou uma delas.
- Não devias de te render ao medo. Ele condiciona os sonhos. faz-nos desistir deles, mesmo antes de saber se vale a pena sofrer por eles.
- Talvez.
- O projecto pode muito bem ser um fracasso, mas se não tentares, nunca o saberás. E perderás todas as alegrias que ele te dará. Tu mesma disseste que essas crianças precisam de um espaço, de amor. Não é preciso ser um génio para perceber que terás muitas dificuldades, mas sei que vão valer a pena.
- Sabes?! - Gio falava do projecto mas ela pensava na sua relação com Max - E se as coisas correrem mal?
- Se correrem, o que duvido. Podes sempre voltar a trabalhar para mim.
- Estás a despedir-me?!
- Acho que precisas de um empurrão no caminho certo. Eu também precisei. - Gio tirou-lhe a chávena das mãos - Vamos, do que estás à espera?!

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