James abriu a porta como normalmente, avisando que o "menino" esperava por ela no escritório. Achava uma certa piada à forma como os empregados mais velhos o tratavam. Antes de entrar no escritório foi ver Yorin, a pequena já caminhava e não dava descanso à pobre Carmem.
Apesar do turbilhão que eram os seus sentimentos, ficou mais animada depois de estar com Yorin. Bateu na porta do escritório levemente antes de entrar.
- Desculpa. Atrasei-me um pouco, não era minha intenção.
- Atrasada ou não, tens sempre tempo para ver Yorin.
- Estás a dizer-me que não o posso fazer?!
Ele largou a agenda e olhou-a pela primeira vez desde que entrou. Franziu o sobrolho e dirigiu-se até à secretária onde ela estava a trabalhar e sentou-se na ponta da mesma.
- Porque tens de interpretar da pior maneira tudo o que digo?! - Segurou-lhe o rosto e obrigou-a a olhá-lo. - Estiveste a chorar?!
- Claro que não! - Mentiu - Estou apenas cansada.
Tentou afastar-se dele e daquelas mãos que a deixavam louca de desejo só de a tocar, ao notar as intenções dela baixou a mão, mas para a forçar a levantar-se e puxá-la até sentir as ancas dela no meio das suas pernas. Agarrou a mão dela e levou-a até aos seus lábios. Sem deixar de a olhar nos olhos beijou-lhe o pulso suavemente, o que provocou uma descarga sensual por todo o seu corpo levando-a a morder o lábio inferior.
- Se alguma coisa estivesse mal dizias-me ?! - Richard continuava a olhar para ela. - Dizias?!
- Algo como? - Christina estremecia de desejo, ele não tinha consciência do poder que tinha sobre ela ou não se importava? - Não estou a perceber.
- Não sei, diz-me tu.- Voltou a beijar-lhe o pulso.
- O que está mal é beijares-me assim.
- Oh...estás a queixar-te da forma como beijo?! - Ele sorria- Acho que tenho de tentar de outra forma.
- Não...
Richard beijou-a ao mesmo tempo que a apertava junto a si, brincou com a sua língua até que ela gemeu, sentiu as mãos dele na pele nua das suas costas e chegou-se mais a ele. Soltou um gemido mais rouco e ele afastou-a.
- Espero ter boa nota no teu exame. - Richard beijou-lhe o pescoço - Até hoje nenhuma mulher se queixou da forma como beijo.
Aquelas palavras foram como um balde de água fria. Nunca imaginou passar de um extremo a outro da excitação, tão rapidamente.
- Não, imagino que não. - Murmurou baixinho.
- Disseste algo? - Richard já estava ao telemóvel.
- Não.
Voltou a concentrar-se no trabalho. Richard teve de ir aos armazéns, esperava uma encomenda e queria estar lá para a receber. Quando anoiteceu ele ainda não tinha regressado, como tinha tudo terminado foi até à sala onde estava Yorin, ofereceu-se para ficar com a pequena, coisa que a ama agradeceu. Depois de lhe dar de comer, brincou com a pequena até que se fez hora de a deitar. Levou-a para o quarto já meio dormida e leu-lhe uma história até que ela adormeceu. Quando se voltou viu Richard apoiado na porta, o seu olhar era indecifrável.
- Esta também fugiu?
- Quem?!
- Carmem.
- Claro que não! Apenas se fez tarde e eu ofereci-me para ficar com Yorin.
- Compreendo. - Richard esperou que ela saísse do quarto e fechou a porta - Vou levar-te a casa.
- Não é preciso. Chamo um...
- Quando percebes que não te vais ver livre de mim?! - Richard segurava a mão dela - Pelo menos, não tão facilmente.
- Um dia conseguirei.
- Não se eu o puder evitar.
- Não és Deus! Nem dono de ninguém!
- Vais começar a discutir comigo?! Não é boa ideia, sabes disso.
Christina lembrou-se do fim de semana e de como ele acabou com os protestos dela. Sentiu-se corar e baixou a vista. Envergonhada, não protestou quando ele lhe colocou a mão nas costas para a acompanhar até ao carro.
Assim que Richard parou o carro saiu, não fosse ele ter a feliz ideia de a beijar.
Tentando acalmar-se bebeu chocolate quente e deitou-se com a sensação de que teria pesadelos, mas dormiu como à muito tempo não fazia. Acordou animada e decidida, pelo menos a tentar, em acabar com o poder que ele tinha sobre ela. Sentia-se atraída por ele, mas se deixa-se de o trabalhar para ele, consequentemente deixaria de o ver e a atracção que sentia acabaria por ter fim. Ligou para Ana, ela era a única pessoa que a podia ajudar. Ana tinha de arranjar forma de explicar a Richard que ela não tinha roubado a peça. Pois ela nunca conseguiria arranjar provas disso. Mas o telemóvel ia directamente para a caixa de mensagens. Saiu para esperar Richard decidida a tentar mais tarde, afinal o dia ainda estava a começar. Mas os dias foram passando e Ana continuava sem atender.
Christina encheu a chávena de café e foi para o jardim, sentia-se sozinha naquela casa enorme, era dia de descanso do pessoal doméstico. Richard foi ao escritório principal e Carmen tinha levado Yorin ao pediatra. Soltou um suspiro, apesar de gostar do sossego, achou a casa demasiado silenciosa. Depois de actualizar o site com os novos artigos não tinha mais nada que fazer, estava aborrecida. Olhou o escritório, a secretária estava sempre desorganizada e as gavetas sempre cheias de papéis. Resolveu arrumar tudo. Apanhou uma gaveta e levou-a para o sofá. Encontrou papéis que deviam muitos dias ao caixote do lixo! Mas aqueles ia deixá-los num cesto para que ele os visse, não queria correr o risco de o irritar atirando algo que ele considerava importante.
No meio daqueles papéis todos, um envelope de uma clínica privada chamou a sua atenção. Pareciam exames médicos! Que estariam ali a fazer?! O envelope estava aberto, por isso tinham visto o seu conteúdo, talvez não fosse importante. Colocou o envelope em cima da secretária e apanhou outra gaveta. Mas não conseguia deixar de pensar no envelope e porque estava ali no fundo da gaveta. Disse para si mesma que independentemente da razão, não lhe dizia respeito. Voltou a organizar as gavetas mas a curiosidade falou mais alto. Apanhou o envelope e tirou a única folha que continha.
Era um teste de paternidade! Quando viu os nomes de Richard e Yorin sentiu a sua cabeça latejar. Leu atentamente o exame, o teste indicava que ele não era o pai. Ficou a olhar a folha na sua mão sem acreditar no que tinha na sua frente. Não era o pai, mas se mandou fazer o teste desconfiava que sim! Porque suspeitou disso?! Que idiota era! Só podia ter um motivo. Tinha tido um caso com a cunhada! Que tipo de homem era ele?! Nem a mulher do irmão estava a salvo dele! O que diziam sobre ele era verdade, se desejava uma mulher, tinha de a conquistar. E a julgar por aquilo não se importava quem ela fosse. Sentiu as lágrimas deslizarem pela sua cara. Como podia sentir qualquer tipo de sentimento por ele?! Não merecia nem a sua compaixão.
Naquele instante ouviu um carro parar, rapidamente guardou o envelope na mesma gaveta de onde o tinha retirado e fazendo um esforço enorme por controlar as lágrimas voltou à gaveta que tinha entre mãos.
- Mas que fazes?! - Richard parou na entrada do escritório. - Não sabia que era dia de limpeza.
- Terminei o que pediste e actualizei o site, como não tinha que fazer resolvi arrumar as gavetas.
- Nem sei bem o que por aí está. Vou atirando para aí o que não precisa de atenção imediata, possivelmente metade é para deitar fora.
Christina olhou para ele, parecia sincero. Talvez não se recorda-se de ter guardado ali o exame. Afinal não parecia aborrecido com o facto de ela remexer nos papéis dele. Talvez estivesse a imaginar coisas.
- Tens tudo separado em pastas.
- E aquilo ali? - Richard apontou para a cesta em cima de uma cadeira - Ainda vais verificar esses?!
- Esses são para tu veres.
- Achas que não tenho mais nada que fazer?!
- Muito bem, eu vejo. Mas se deitar algo fora não reclames depois.
Christina sentiu a raiva crescer dentro dela e fechou a gaveta com demasiada força, o som da madeira a bater ecoou pelo escritório. Bastou vê-lo para tentar desculpá-lo, para começar a achar que talvez ele não se recorda-se do exame. Era uma idiota! Recordando ou não, o facto é que o exame existia! Era a prova do seu caso com a cunhada.
- Está tudo bem?!
- Mas porque raio insistes em perguntar isso?
- Porque desde que voltámos, faz quase um mês, que estás estranha. - Richard segurou-a por um braço e levou-a até ao sofá - E não me digas que é das hormonas.
- Talvez me tenha arrependido...
- De teres dormido comigo?!
A voz dele pareceu-lhe cheia de mágoa, como se o facto de ela se arrepender o magoa-se mesmo. Mas não podia ser, depois desse fim de semana não a tinha procurado mais. Sinal que tinha onde acalmar os seus desejos. Teve sempre as mulheres todas que queria, a sua cunhada incluída, não se importava com o que ela pensava ou sentia. Apenas se iludia se pensava assim!
- Podes não acreditar, mas não é normal dormir com os meus chefes.
- Alegra-me ouvi-lo. - Richard levantou a mão e brincou com uma madeixa de cabelo dela - Prefiro que sejas minha.
- Não sou tua. - A voz não soou tão confiante como pretendia, a mão dele acariciava agora o seu pescoço - Não...
Fechou os olhos, queria evitar que ele visse o muito que a afectava aquelas caricias, mas foi um erro. Richard já se tinha apoderado da sua boca e procurava os seios dela por baixo da blusa. Quando os alcançou ela gemeu e ele acabou por lhe tirar a blusa, deixando-a apenas com o soutien rendado de cor preta. A boca dele percorreu a pele nua dela, pouco depois estava deitada no enorme tapete do escritório fazendo amor com ele. Enquanto os corpos nus se recompunham do novo encontro, ela sentiu-se envergonhada. Como pode entregar-se a ele depois de saber que não tinha qualquer tipo de escrúpulos?! E a julgar pela sua conduta ela também estava desprovida de alguns.
Assim que chegou a casa encheu a banheira e meteu-se lá dentro sentindo-se vazia. Se queria sair daquilo com alguma dignidade tinha de construir barreiras. Construí-las e não permitir que ele as pudesse derrubar. Com tudo aquilo esqueceu-se de voltar a telefonar a Ana.
O telemóvel tocou acordando-a, era sábado. Quem telefona a uma pessoa a esta hora da manhã num fim de semana?! Olhou o ecrã, não reconheceu o número, era enorme, quando atendeu a pessoa já tinha desligado. Pensou na cunhada que estava grávida, teria acontecido algo?! Mais desperta que quando bebia dois expressos, ligou para a mãe. Respirou de alivio quando lhe assegurou que estava tudo bem. Depois de prometer ir visitá-los proximamente, despediu-se. Possivelmente seria alguma sondagem ou aquelas empresas que chateiam os demais para conseguir clientes.
Olhou o dia lá fora, o sol brilhava, apenas uma leve brisa agitava as folhas das árvores. O relógio digital ligou o rádio automaticamente, como fazia todos os dias às oito da manhã. Já que estava acordada ia correr, vestiu o fato de treino e agarrou a chave de casa. Saiu sem rumo, quando tinha tempo corria no jardim, mas tinha necessidade de se afastar de tudo o que conhecia. Queria sair sem destino, parando apenas onde não encontra-se ninguém. Quando resolveu parar estava junto aos cais. Fazia imenso tempo que não ia até ali. Mais precisamente desde que deixou Willie. Dizem que quando isso acontece é o subconsciente a indicar-nos algo, nunca acreditou nisso, mas naquele preciso instante não tinha a certeza de nada. Sentou-se no muro que ladeava o cais absorvendo a brisa marinha, percebeu que tinha sentido falta da calma que o mar lhe transmitia. Fechou o olhos sentindo a brisa na cara.
- Christina?!
Ela reconheceu a voz de Willie. Voltou-se com a certeza que era ele.
- Willie. - Cumprimentou-o sorrindo.
- Meu Deus. À quanto tempo.
- Quase um ano.
- Já?! Mas diz-me, como estás?! Que pergunta idiota. Estás fantástica.
- Obrigada, também não estás mal.
Beijaram-se na face meio sem jeito. Por alguns minutos olharam-se em silêncio, depois Willie começou a rir e ela acompanhou-o. Willie podia ser um querido se a isso se prepusesse, o que acontecia raramente. Mas sentia-se tão sozinha que por muito aborrecido que ele se torna-se, ela ia adorar a companhia dele.
- Parecemos dois idiotas. - Ele fez-lhe sinal para que se senta-se - Não sabia que continuavas a vir aqui.
- Não venho, hoje foi excepção.
- Ainda bem, tive saudades tuas.
- Willie! - Ela levantou-se.
- Não me interpretes mal, tenho saudades das nossas conversas. - Willie olhou em redor - Aceitas um café?
- Porque não.
Caminharam até ao quiosque e sentaram-se na esplanada do jardim a ver as crianças brincar. Willie contou-lhe que depois de algum tempo sozinho, finalmente tinha namorada e um emprego novo, era sócio num pequeno gabinete de contabilidade. Se tudo corresse como planeou casaria brevemente. Ficou feliz por ele e contou-lhe algumas coisas da sua vida, mas ocultou Richard. Conversaram até que o telemóvel de Willie tocou, era a namorada, lembrando-o do almoço com os pais dela. Christina sorriu, continuava o mesmo Willie de sempre, ouviu-o prometer não demorar antes de desligar. Mas insistiu em acompanha-la até aos cais. Quando Willie se despediu dela abraçaram-se e ela teve a sensação de que ouviu a voz de Carmem ali perto, o que significava que Yorin estava ali. Depois de Willie se afastar olhou em redor procurando Carmem e Yorin. Mas não viu ninguém conhecido. Sentindo-se mais sozinha que nunca, voltou para casa e preparou uma pequena mala. Sabia onde se iria sentir querida e amada.
O comboio parou na estação e chamou um táxi. Como só havia um táxi na aldeia, e tinha ido levar uns clientes à cidade, tinha de esperar na entrada da estação até que este estivesse livre. Não queria estragar a surpresa telefonando para casa. Nunca imaginariam que ela estava ali, não depois de ter falado com a mãe essa mesma manhã e prometer visitá-los brevemente.
Lembrou-se do dia que pisou aquela estação pela primeira vez, dos avisos e recomendações do pai sobre os rapazes da cidade e sorriu ao recordar os beliscões da mãe no braço do seu pai, para que deixa-se de a assustar. Que ela não era mais a menina pequena dele, que tinha de voar do ninho e se quisesse voltar um dia ela voltaria, mas para decidir o que queria, tinha de ver o mundo.
Uma lágrima caiu pelo seu rosto, desejou ter ouvido o pai e nunca ter saído dali.
- Oi! Afinal não estava a ver mal. És mesmo tu. - A cunhada sorria, a barriga já se notava. - Não te esperávamos.
- Eu sei. - Beijou a cunhada e demorou o abraço - Precisava de voltar a casa.
- Está tudo bem?!
- Sim. - Não conseguiu conter as lágrimas perante o olhar preocupado da cunhada - Não, não está.
- Anda.
Entrou no carro da cunhada e esta conduziu em silêncio, a única coisa que se ouvia era o choro mal contido de Christina. Quando se acalmou contou à cunhada tudo o que lhe tinha acontecido nestes últimos meses.
- Promete que não dizes à mãe. - Christina ainda soluçava - Promete. Não suportaria que o pai a olha-se com o olhar de "eu avisei, mas tinhas de a apoiar"
- Prometo. Mas, à algo que não consigo entender.
- O quê?!
- Bem, ele pode ter as mulheres que quiser, certo?! - Christina anuiu - Se assim é, porque insiste em ter-te a seu lado?
- Porque possivelmente quer tudo o que é mulher.
- Dizes isso por causa do exame que encontras-te? - Ela voltou a anuir - Sabes que podes mandar fazer os exames em nome de outra pessoa?! Se dizes que ele não deu sinais de saber desse exame, já pensaste que talvez nem saiba da sua existência? Duvido que se ele soubesse tivesse deixado isso por aí assim, onde seria facilmente encontrado.
- Achas?!
- O que acho é que estás de cabeça cheia e com medo do que sentes. Por isso não consegues ser objectiva. Quem está de fora vê as coisas de outra forma. Lembras-te de quando o teu irmão me pediu em namoro?!
- Se lembro... - As duas riram e ela sentiu-se melhor - Fugiste pela aldeia gritando que ele te queria beijar. E nessa noite dormiu na cadeia, porque o teu pai era o inspector.
- Sim. - Ela ficou vermelha - Bem, o que interessa é que mesmo depois dessa noite, ele não desistiu e voltou a correr atrás de mim uma e outra vez, e o beijo acabou por acontecer, se bem que mais tarde e no palheiro do teu pai.
- Não!?!?
- Sim! - A cunhada ficou muito séria - Quando está destinado não adianta fugires.
- Nunca poderei fugir para muito longe.
- E queres?!
- Sinceramente não.
Christina sentiu-se mais animada depois daquela conversa, agora via as coisas mais objectivamente. Talvez a cunhada tivesse razão e o exame não fosse dele. Talvez fosse o irmão que o mandou fazer por desconfiar da esposa, afinal Yorin não tinha semelhanças com eles. Mas agora não queria pensar nisso, queria aproveitar o resto do fim de semana com a família e depois voltar para a sua casa. E se o destino assim o dita-se, para o braços de Richard.
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