sexta-feira, 26 de maio de 2017

NOS TEUS BRAÇOS 10ª PARTE



Durante alguns dias, sempre que via a nova empregada, lembrava-se dela agarrada a Alec. Até criara uma certa aversão à rapariga, evitava todo o contacto com ela sempre que isso era possível, até quando ia beber café, se era ela que lá estava, voltava para trás. Talvez estivesse a ser paranóica, ele continuava a tratá-la como sempre, aliás, dias depois do acidente, ele mostrava-se mais atencioso e oferecia-lhe flores com regularidade. Principalmente quando estava em viagem, nessa altura, todos os dias chegavam rosas e ultimamente vinham acompanhadas de bombons! E todas essas atenções aumentavam as suspeitas dela.

Apesar de estar em Londres, tinha pedido para lhe entregarem um ramo de rosas vermelhas no escritório. Mas que ela tinha pedido para deixarem no hall, o cheiro das rosas era inebriante e causava-lhe dor de cabeça por o escritório estar sempre fechado. O que a fez recordar que as dores de cabeça eram cada vez mais frequentes. Começaram pouco depois do acidente dele, e pareciam cada vez mais fortes e acompanhadas de outros sintomas. Um dia mal se conseguiu levantar, o que preocupou Alec. Depois de recusar que um médico a fosse ver a casa, ele deu-lhe um prazo para ir a um à escolha dela, depois disso, se não o fizesse rapidamente, ele iria com ela, nem que para isso a tivesse de levar ao colo. Ela sorriu-lhe e prometeu fazê-lo, mas acabou por tomar uma aspirina e adiou a visita ao médico.


- Já foste ao médico? - Marisa cheirou uma das rosas.
- Ainda não.
- Quando pensas fazê-lo? Alec telefonou a ver como estavas, está preocupado.
- Se estivesse muito preocupado deixava de comprar tanta rosa.
- Que queres dizer com isso?
- Nada, esquece.
- Sabes que não vou esquecer! - Marisa puxou-a para dentro do salão. - Que se passa?!
- Nada que eu não esperasse. Mas na verdade nunca pensei que fosse tão difícil aceitá-lo.
- Estás a falar de quê concretamente?!
- Alec anda meio estranho, como se estivesse distante.
- Não estás a imaginar coisas?
- Rezo para que sim. Mas quanto mais penso no assunto, mais me convenço que tenho razão.
- Talvez seja o trabalho. Não tarda está aí o Natal. Dizes que está mais afastado, percebeste isso à muito tempo?
- Desde começou a comprar as rosas.
- Se fosse outro homem, diria que tem uma amante, mas Alec?! - Marisa calou-se a ver o brilho nos olhos dela - Tu achas que ele... Não! Alec nunca.

Alexandra contou-lhe o que tinha visto no bar e Marisa olhou para ela com os olhos muito abertos.

- Não sei... não me parece coisa dele.
- Se está tão inocente como pensas, porque te telefonou a ti? Desde que partiu à dois dias que não me telefona. E telefonava todas as noites.
- Nego-me a aceitar isso. Conheço Alec à muitos anos, é verdade que teve muitas mulheres, mas nunca foi infiel a nenhuma delas. Fosse apenas por um mês ou uma semana!
- Então explica-me porque anda afastado depois de eu o ter visto com aquela... - Alexandra abanou a cabeça - Juro que queria estar enganada, mas não consigo pensar noutra coisa. Dias depois disso começaram a chegar as rosas e os bombons. Agora foi para Londres e não me telefonou uma única vez! Se arranjares uma boa explicação, eu acredito que ando a imaginar coisas.
- Não sei que diga. Se é assim enganou-me muito bem! Mas... Não! - Marisa abanou a cabeça - Não acredito que ele fosse arranjar uma amante! Acho que estás a imaginar coisas e o pior é que começas a convencer-me. - Marisa suspirou - Porque não falas tu com ele?! Quando ele regressar podem tirar uns dias para resolver isso.
- Se as coisas tiverem solução.
- Claro que têm! Vamos mudar de assunto. Fala-me da festa, como estão os projectos?

Pouco a pouco, foi esquecendo os problemas à medida que se concentrava em especificar a Marisa os detalhes da festa.  Ainda falava com Marisa, sobre as decorações desse fim de semana, quando lhe disseram que a esperavam na recepção. Imaginou que fosse Miguel com mais desculpas, sabia que ele não ia desistir com tanta facilidade dela. Dela não, do dinheiro que ela iria receber futuramente. Com isso em mente dirigiu-se até lá o mais rapidamente possível.

- Clara! - Alexandra não conseguiu esconder a alegria ao ver a outra mulher.
- Minha querida, como estás bonita.
- Que faz por aqui?!
- Não posso vir visitar-te?
- Claro que sim, e ainda bem que o fez.
- Trouxe-te uma coisa da minha terra.
- Não precisava. Quer um café?
- Podemos ir para um sítio mais privado?
- Está tudo bem?
- Sim, apenas quero contar-te uma coisa e não quero que ouçam. É um pouco embaraçosa.
- Vamos até ao meu escritório.

Alexandra pediu para lhe levarem dois cafés e pouco depois um empregado entrou com os cafés num tabuleiro que deixou em cima da mesa.

- Obrigada. - Alexandra agradeceu ao rapaz e deu uma chávena a Clara - Então diga lá o que a preocupa.
- Até me sinto um pouco envergonhada.
- Casou?!
- Ora essa! Porque devera de me envergonhar por isso?!
- Tem razão, não é motivo para tal. Então que aconteceu?
- Lembras-te quando estive aqui, e não foi contigo ver o palácio? Quando adoeci?!
- Sim...
- Foi a fingir. - Clara baixou a vista para a chávena - Não consigo deixar de pensar que te enganei para que saísses com aquele estranho de olhos lindos. Espero que não fiques chateada comigo. Depois de estar em casa, não deixava de pensar que te empurrei para os braços de um homem que mal conhecias e que depois de uns dias ele ia abandonar-te também. Ajudei-te a substituir um mal por outro. Mas vejo que me preocupei demais, estás linda. Posso perguntar uma coisa?
- Diga.
- Durou muitos dias o vosso romance?!
- Por enquanto ainda dura.
- A sério?! E trabalhas aqui. - Clara sorriu - Gostas do novo emprego e do patrão? Falavas com tanto carinho de António...
- Tendo em conta que Alec é o dono do hotel, era complicado se não gostasse.
- O dono?!
- E vivemos juntos.
- Oh... então está tudo bem. Por isso esse ar de felicidade que tens.
- Não adianta mudar de assunto. Não me esqueço de que me enganou e me deixou preocupada!
- Oh sim... estavas tão preocupada que só regressaste no dia seguinte.

As duas riram e à medida que Clara relatava as suas aventuras, ela esqueceu as desconfianças sobre Alec.
Antes de ir para o quarto que tinha reservado Clara tirou do saco um embrulho de papel pardo e estendeu-lho. Quando o abriu, o cheiro a azeite atingiu-a como uma bofetada e fez uma careta ao sentir a dor de cabeça aumentar, assim como o mal estar.

- Não gostas?! São bolos de azeite da minha terra, uma especialidade.
- Obrigada, gosto sim. Mas não sei que se passa, ultimamente quando sinto certos cheiros, fico com um mal estar geral e umas dores de cabeça enormes.
- Já foste ao médico?
- Ainda não. Mas parece que tenho de ir com mais urgência do que pretendia. Ultimamente estão mais fortes.
- Se quiseres companhia conta comigo.
- Vai ficar no hotel?
- Por umas semanas, estou farta de estar em casa. E este tempo de chuva não ajuda à minha depressão.
- Imagino que não, olhe eu tenho de trabalhar, mas vou arranjar tempo para almoçarmos.
- Amanhã depois de ires ao médico?! - Clara olhou para ela com uma sobrancelha levantada.
- Não tenho consulta. Primeiro tenho de a marcar.
- Estás esquecida que é para isso que estão as urgências?
- Isto não é uma urgência!
- É se forem muito fortes, como dizes que são, e recorrentes! Tens de te cuidar rapariga.
- Vou pensar nisso.

Depois de Clara sair, fez uma rápida pesquisa sobre a possível causa daquelas dores de cabeça. Assustou-a a enorme quantidade de doenças que encontrou e marcou consulta num consultório que encontrou na lista.
Quando regressou a casa Mónica já não estava, a casa parecia vazia demais sem ele. E depois que começou a suspeitar que ele andava com a nova empregada, parecia que deixara de pertencer ali, que a paz que a casa lhe dava simplesmente desaparecera. Deitou-se sem comer, a sua cabeça latejava. Nunca teve uma dor de cabeça tão intensa na sua vida!

Acordou de madrugada sentindo que a cabeça explodia. Olhou para o relógio. Eram seis da manhã! A noite terminava e a dor não aliviava como era hábito. Não suportaria mais um dia com aquela dor! Pediu um táxi e foi para o hospital. Uma médica muito simpática mandou-a fazer vários exames e disse para não se preocupar, que a maioria dessas dores são causas normais, tais como stress, a menstruação...
Enquanto aguardava os resultados fez as contas, esperava a menstruação para a semana. Riu-se ao perceber que aquela era a única coisa certa na sua triste vida! Mas nunca teve qualquer mal estar derivado disso.
Pouco depois uma enfermeira chamou-a e acompanhou-a a um gabinete onde a médica já aguardava.

- Disse que está com dores de cabeça à algumas semanas e tomou aspirina para aliviar.
- Sim. Fiz mal?!
- Possivelmente não. Mas doravante é preferível não tomar mais.
- Porquê?!
- Não se assuste. É perfeitamente normal nestes casos.
- Nestes casos?!
- Sim, está grávida.
- Grávida?! Não pode ser!
- O facto é que está.
- Mas a menstruação sempre foi certa, e nunca falhou.
- Não seria a primeira mulher que está grávida e menstrua. Por isso vamos fazer uma ecografia para nos certificarmos que está tudo bem. Suba para ali, a enfermeira já a vai ajudar.

Grávida?! Não podia, Alec sempre usara preservativo. Como podia ter acontecido?! Tinha de ser outra coisa qualquer. Não se engravida usando protecção... A sua mente parou ao recordar que, num fim de semana, eles tiveram um pequeno "acidente" com um preservativo.

- Ora bem, vamos lá ver o bebé.

 A médica passava com o aparelho na barriga lisa dela, enquanto ela pensava como podia estar grávida?! Ali não cabia nem um gato recém nascido, quanto mais uma criança!

- Ora aqui está ele! - A médica voltou o ecrã na sua direcção - Vê?! Ainda é muito pequeno mas já se começa a notar as pernas e os braços, o que me leva a acreditar que tem mais ou menos 10 semanas.

Alexandra olhou o ecrã, não conseguia perceber bem como o descrever. Apenas sabia que era o seu filho!
 Ao ver o pequeno ser, tão frágil, ali na sua barriga, foi invadida de um sentimento muito superior ao que ela sentia por qualquer outra pessoa. Uma lágrima deslizou pelo seu rosto ao perceber que já o amava. Como podia sentir algo assim se acabara de saber que ele existia?!

- Não se preocupe. Todas essas variações de humor são perfeitamente normais.

Quando saiu do consultório levava uma lista de possíveis obstetras que a podia acompanhar. Mas naquele momento não estava preocupada com o médico, como reagiria Alec?! Nunca tinham falado em formar uma família. Eles nunca falavam muito na verdade, nunca de coisas realmente importantes.

Olhou o relógio no pulso, ainda era cedo para começar a trabalhar. Mas ir a casa e regressar pouco depois não tinha lógica. Principalmente porque não tinha nada que fazer em casa.
Quando entrou no hotel apenas viu o porteiro. Dirigiu-se ao seu gabinete para deixar a mala e ao passar em frente ao gabinete de Marisa ouviu vozes pela porta entreaberta. Reconheceu as vozes, era a mulher da limpeza e a empregada nova. Duas pessoas que, embora por motivos diferentes, ela não simpatizava.

- Por isso lhe estou a perguntar que devo fazer.
- Olha rapariga, essas coisas trazem responsabilidades. Não podes andar por aí a dizer que és amante desta ou aquela pessoa. Muito menos quando a pessoa é o patrão.
- Acha que não sei?! Alec pediu para não dizer nada, que esperasse uns dias até ele se desfazer de Alexandra. Mas está a demorar muito tempo. Podia esperar mais um tempo mas sei que ela não simpatiza comigo, e quando souber...

Alexandra sentia as lágrimas a caírem pelo rosto, mas era incapaz de se mexer perante o relato que a rapariga fazia.

- Por isso acho que como amante dele, porque agora sou eu a amante, eu é que mereço estar lá em casa, não ela! Não tenho razão?!
- Tu é que sabes, isso são coisas que não me dizem respeito. E não sei se o patrão vai gostar de saber que estás com essas conversas.
- Ora, se é verdade.
- Sendo ou não, existem coisas que só trazem problemas depois de as dizeres! Agora sai da frente, tenho de terminar o meu trabalho. Não quero arranjar problemas.

Ao ouvir o carrinho da limpeza ela meteu-se na primeira porta que encontrou, o gabinete de Alec. Por uns segundos ficou encostada à porta sem saber como reagir ao que tinha acabado de ouvir.
Perdeu a noção do tempo que ali ficou, sentindo as lágrimas caírem silenciosas pelo seu rosto. Quando sentiu forças para sair, foi directa ao seu gabinete escreveu uma carta a Marisa e pediu um táxi.
Estava à espera deste quando Clara apareceu na entrada.

- Minha querida bom dia.
- Bom dia Clara. - Alexandra escondia os olhos inchados com os óculos de sol - Dormiu bem?
- Que aconteceu? E não me respondas que nada, conheço-te o suficiente para saber que nunca usarias esses óculos, num dia destes, sem um motivo. Foste ao médico e deu-te más noticias?!
- Fui. - Alexandra olhou o rosto preocupado de Clara. - Mas pode ficar tranquila. Não é grave.
- Graças a Deus!.
- Peço desculpa, mas não vou poder almoçar consigo. Tenho de partir e preferia fazê-lo antes de Marisa chegar. - Alexandra tirou um papel da sua mala, onde escreveu algo antes de o entregar a Clara - Esta é a minha morada no Alentejo. Quando quiser visitar-me será bem vinda.
- A gravidez não desaparece por... - Clara fez uma cara de horror - Não vais...
- Não, não vou. - Alexandra respirou fundo - Como soube?
- Pelos sintomas. O que me despistou foram as dores de cabeça. Não vais dizer a Alec?
- Um dia, por agora ele está a braços com uma criança um pouco maior. Desculpe, o meu táxi chegou.

Quando chegou a casa de Alec, ouviu Mónica e Mateus a falarem na cozinha. Foi directamente para o quarto e atirou as suas coisas para uma mala, deixou no roupeiro todas as roupas que Alec lhe tinha comprado. Poderiam servir para a próxima amante! Sentindo a raiva crescer dentro dela fechou a mala com fúria. Desceu as escadas e deu com Mónica na sala a limpar o pó.

- Está tudo bem menina? - Mónica olhava para a mala.
- Sim.
- Vai ter com o menino?!
- Não. - Alexandra mordeu a língua, perdeu ali uma boa desculpa para justificar a sua partida. A julgar pelo olhar de Mónica tinha de lhe dar um motivo válido, de repente lembrou-se de uma colega de escola, a quem não lhe faltavam familiares doentes - A minha madrinha está doente.
- Sinto muito. Estimo as melhoras menina.
- Obrigada Mónica.
- Menina?!
- Sim. - Olhou para ela impaciente.
- Quer que diga algo ao menino quando regressar?
- Eu já lhe liguei, mas obrigada.

Respirou fundo ao pedir ao taxista que a levasse a casa, ao seu Alentejo! De onde nunca devia de ter saído! Recostou a cabeça e deixou que as lágrimas caíssem pelo seu rosto, precisava aliviar aquele aperto no coração. Como pudera ser tão idiota e cometer o mesmo erro duas vezes?! Como podia ter acreditado que o desejo que Alec sentia por ela não ia acabar?! Ou que se transformaria em algo mais forte?! Como pode apaixonar-se por uma pessoa que mal conhecia e acabar grávida dele?!

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