sábado, 1 de julho de 2017
O REFÚGIO 2ª PARTE
Ellen não teve qualquer dificuldade em chegar a Carlingford, mas o mesmo não aconteceu quando perguntou onde podia encontrar alguém que a levasse até à mansão de Luc MacKeane.
Quando nomeava o nome de Luc as pessoas mudavam completamente de atitude, como se ele fosse "persona no grata" por ali. Talvez fosse melhor procurar onde dormir em vez de tentar chegar a Luc MacKeane, as pessoas não pareciam dispostas a falar nele, nem em levá-la até lá. Bebericava o chá quando um homem começou a caminhar na sua direcção. Tinha a barba por fazer e o cabelo crespo, vestia uma roupa bastante gasta pelo uso, mas ainda se notava o tecido forte da camisa, assim como das calças que desapareciam dentro de umas botas altas.
- Procura MacKeane?!
- Sim.
- Vou para esses lados. Se quiser posso deixá-la perto.
- Agradeço imenso.
Ellen bebeu o resto do chá e dispunha-se a segui-lo quando se lembrou que ainda não tinha onde deixar as coisas, talvez fosse melhor pagar um quarto e deixar as coisas lá. Olhou para o homem que estava a sair do pub. Se demorasse a decidir que fazer, perdia a única pessoa que se tinha oferecido para levá-la. Olhou a mala, também não era assim tão grande. Agarrou-a decidida e saiu para o ar frio da tarde. Subiu na carrinha velha e fechou a porta que, a julgar pelo ruído que fez, parecia que nunca era aberta. Aquela observação levou-a a pensar que estava num carro com um desconhecido e que ninguém sabia onde ela estava. Olhou para ele, não tinha aspecto de louco, nem de ladrão. Mexeu-se incómoda no banco e a pele rangeu.
- É a sua primeira visita a Carlingford?
- Sim. Venho a trabalho.
- Imaginei que assim fosse.
- Sou Ellen, Ellen Martin.
- Sim.
O homem não disse o seu nome, como seria de esperar, e continuou a conduzir em silêncio.
- Mora perto de MacKeane?!
- Algo do género.
- Numa aldeia vizinha?
- As mulheres são muito curiosas, principalmente as da cidade.
- Só perguntei porque podia precisar de boleia para regressar.
- Não seria a primeira.
- Quer dizer que chegaram outras mulheres?
Ele olhou para ela e sorriu, Ellen permaneceu em silêncio esperando que lhe respondesse, mas ele não o fez.
- Eu não o conheço. - Ellen insistiu em manter uma conversa - E como não tenho quarto na vila pensei que...
- Costumam dormir na mansão.
- Costumam?!
Mas o homem voltou a ignorá-la e a concentrar-se na estrada que ficava mais estreita e cheia de buracos. Durante algum tempo a única coisa que se ouvia era o motor do carro, Ellen olhava as árvores que passavam vagarosamente quando ele parou.
- Se seguir essa estrada vai chegar em cinco minutos.
Ellen olhou o caminho que o homem lhe indicava, em vez de estrada mais parecia um carreiro de cabras! Olhou para ele pensando que era uma espécie de brincadeira, mas não o viu sorrir apesar do olhar insistente dela.
- Tem a certeza que é por aqui?!
- Absoluta. Conheço o caminho como a palma da minha mão.
O olhar que ele lhe devolveu foi o de uma pessoa ofendida. Ela continuava relutante em sair da carrinha, mas pensou que tinha feito aquela viagem para conseguir aquela entrevista e não ia sair dali sem ela! Abriu a porta antes de se arrepender e depois de agradecer, começou a caminhar pela estrada cheia de buracos.
Pensou no que ele disse, cinco minutos. Não devia de demorar muito mais a avistar a mansão. Mas os cinco minutos passaram e continuava sem encontrar a mansão! Olhou em redor, apenas árvores e pedras. Se fosse assaltada ali, ninguém daria por nada. Talvez aquele homem não fosse tão bondoso como aparentava, talvez tivesse um cúmplice por ali escondido! Começou a andar mais depressa e à medida que avançava, uma neblina espessa começou envolve-la enquanto o vento frio lhe chegava aos ossos. Aconchegou o casaco e mudou a mala para a outra mão. Naquele instante agradeceu por ter levado só uma mala e ter calçado uns ténis e não uns sapatos de salto alto! Algo se mexeu à sua frente e ela parou assustada. Ficou por minutos na mesma posição, tentando perceber se era um movimento real, ou se a sua mente estava a pregar-lhe uma partida. Com o coração a querer saltar do peito, rodou sobre os seus calcanhares e começou a caminhar na direcção oposta. O homem tinha dito cinco minutos, mas fazia bem mais de dez que caminhava e não tinha nenhum sinal da mansão! Possivelmente tinha-lhe pregado uma partida, por sinal de muito mau gosto, e naquele momento estava com os amigos no pub a rir-se dela. Se voltasse atrás talvez conseguisse chegar à estrada e...
Começou a respirar mais depressa enquanto o desespero se apoderava dela e se e revelava em forma de lágrimas. Colocou as mãos nos joelhos e respirou fundo tentando controlar as lágrimas. Por uns instantes, imaginou as mais variadas coisas, todas elas desagradáveis, que lhe podiam acontecer ali. Depois fechou os olhos e tentou afastar aqueles pensamentos pessimistas. Não, as pessoas não eram assim tão cruéis! Estremeceu ao recordar Jim. Num ataque de medo, gritou sarcasticamente para o vazio: "Claro, que não. Jim O`Reiley é a bondade em pessoa! "
Voltou a baixar a cabeça e, através da respiração, tentou controlar o medo como lhe ensinaram nas aulas de ioga. Ficou alerta ao ouvir o que lhe parecia ser um som metálico. Pouco depois voltou a ouvir o som. Talvez a mansão não estivesse assim tão longe, talvez não fosse visível devido à neblina. Caminhou atenta à repetição do som, que felizmente começava a ser mais audível e parecia mais cada vez mais perto.
Uns metros à frente algo tomava forma, caminhou mais devagar, parecia-lhe um portão, mas a neblina não a deixava ter a certeza. O som metálico voltou a ouvir-se e ao chegar mais perto percebeu que era realmente um portão, o qual oscilava ligeiramente com o vento fazendo as dobradiças chiar. Respirou de alivio e entrou na propriedade, pedindo para que não tivessem cães! Uma porta começou a materializar-se à sua frente e correu desesperadamente até ela. Olhou procurando algo com que chamar a tenção dos donos da casa, apenas uma maçaneta em forma de cabeça de leão lhe pareceu ser o objecto que procurava. Bateu, talvez energicamente demais.
Uma mulher jovem apareceu na porta e ficou a olhar para ela como se não acreditasse no que via.
- Afinal sempre mandaram alguém.
A mulher desapareceu deixando a porta aberta. Ellen ficou uns instantes indecisa quanto ao que fazer, mas a ideia de que algum cão podia passar por ali e atacá-la, foi o suficiente para se decidir. Desde que fora atacada por um cão em criança que tinha pavor deles! Fechou a porta ao mesmo tempo que colocava a mala no chão. Como a outra mulher demorava a voltar, olhou a divisão enorme. As janelas altas, que deixariam entrar o sol se este se dignasse a brilhar, tinham uns cortinados brancos. Na parede principal, uma lareira que mais parecia um poço de tão funda que era, em frente desta uns sofás igualmente enormes em tons castanhos. Um candelabro pendia do tecto no centro da sala, sob este, uma mesa de madeira, que não tinha nada mais que um centro com algumas flores secas, com as suas cadeiras igualmente pesadas, ocupavam a maior parte do espaço. Uma estante numa parede lateral com alguns livros dispostos desordenadamente e algumas fotografias, na sua maioria retratavam uma família. Uma delas estava caída, levou a mão até ela para a levantar...
- Pensei que me seguisses. - A mulher interrompeu o que ela ia fazer - Não pensei que enviassem ninguém tão rápido.
- Acho que à alguma confusão.
- Confusão ou não, não me interessa.
A mulher caminhava mais rapidamente do que falava, Ellen seguiu-a por um corredor enorme decorado com quadros pintados à mão. Quase que esbarrou na mulher quando esta parou abruptamente.
- Aqui será o teu quarto. Ele está na porta ao fundo, ali em cima tens os horários dos teus afazeres. Boa sorte.
Mal acabou de dizer as últimas palavras desapareceu pelo corredor com uma pequena mala na mão. Ellen olhou para o corredor vazio. Quem aquela mulher pensava que ela era?! E porque lhe tinha desejado boa sorte?! E mais curioso ainda, o que havia ali que a levava a sair quase ao cair da noite, sem pensar duas vezes?! Arrepiou-se ao pensar que talvez fosse uma casa assombrada, não que acreditasse nisso, mas ouvira falar nelas e os irlandeses acreditavam em fadas, duendes entre outras coisas. Riu-se dos seus próprios pensamentos. Nunca se deixou levar por mitos nem lendas, estava apenas assustada com os últimos acontecimentos.
Olhou o quarto, a cama era grande e parecia confortável. Aproximou-se da janela e viu que a neblina estava mais espessa. A pobre mulher devia de estar arrependida de ter deixado o conforto daquela casa. O que a levou a pensar que tinha de encontrar os donos da casa e explicar o engano que tinha ocorrido. Olhou para a mesa onde estava o papel e agarrou-o.
Tratamentos a efectuar:
8.00: higiene
8.30: pequeno almoço
9.00: medicação
10.00: leitura das notícias
11.00: leitura de um livro
13.00: almoço
Ellen olhava o papel de boca aberta, a lista continuava até à meia noite. Não reconheceu o nome da clínica, mas reconheceu o nome de Luc MacKeane. A mulher pensava que ela era sua substituta! Tinha de desfazer aquele mal entendido, não era enfermeira. A única coisa que conseguia fazer era mudar um penso rápido! Agarrou o seu telemóvel para ligar para o número que estava na folha, mas não tinha cobertura. Olhou novamente para o corredor, não se via ninguém, começou a preocupar-se. Quando ele soubesse que a enfermeira tinha deixado a mansão não ia ficar muito satisfeito. Mas ela não tivera culpa, a enfermeira saíra sem lhe dar tempo a explicar. Assim que falasse com ele, ele iria ligar para a clínica e tudo se resolveria. Recordou que ao sair ela tinha dito que ele estava no quarto ao fundo. Mas ele quem?! Não podia ser Luc MacKeane! Tentou recordar-se da última coisa que tinha saído nas revistas sobre ele. Se a memória não lhe falhava, ele estivera no Egipto com a nova namorada mas acabaram por romper dias depois de regressarem. Não se recordava de nada mais. Mas a presença de uma enfermeira requeria alguém doente. Recordou que o pai dele era idoso. Talvez o pai dele estivesse doente e isso o obrigasse a viver ali naquele fim de mundo. Esse era o motivo mais plausível.
Ellen sentou-se no quarto esperando que ele aparecesse, mas parecia que o tempo não passava. Tentando distrair-se agarrou a folha dos tratamentos, segundo o horário estava quase na hora do jantar. Saltou da cama.
Jantar?! Que jantar?! A enfermeira não tinha falado em fazer jantar!
Saiu do quarto e percorreu o corredor espreitando as várias portas entreabertas. Um quarto seguia-se a outro, depois uma sala e um escritório, uma biblioteca, uma casa de banho e depois o que lhe pareceu ser uma sala de leitura, mais à frente um salão, depois outro maior que o anterior e finalmente a cozinha! Respirou de alivio ao constatar que era moderna, durante a busca pensou encontrar uma cozinha com fornos a lenha e com tachos de ferro. Na porta do frigorífico apenas um papel com o que lhe parecia ser o prazo das entregas dos mercearias. Constatou que a última entrega tinha sido nessa manhã. Abriu a porta do frigorífico e viu umas caixas etiquetadas com os nomes dos seus conteúdos e o destino, se eram para o almoço ou para o jantar. A julgar pela quantidade tinha comida para toda a semana! Agarrou uma caixa: Creme de camarão.
Mas porque não faziam ali a comida?! Ela sempre pensou que os ricos tinham empregados para tudo, mas a julgar por aquilo, apenas tinham uma enfermeira. Que, a julgar o que vira até ao momento, servia para tudo! E Luc MacKeane onde estava?! Ela estava ali à algum tempo e ele não dera sinal de vida, talvez estivesse na vila, ou noutro lado qualquer enquanto a pobre ficava ali a cuidar do pai dele! Quem consegue estar num local sem ver viva alma durante o dia a não ser o doente?! E que possivelmente nem dizia palavra!
O som de uma campainha assustou-a. Chegara a hora! Respirou fundo e dirigiu-se à porta de onde saía o som. Enquanto empurrava a porta colocou um sorriso no rosto e entrou no quarto. O sorriso foi substituído por um sentimento de pena ao ver Luc MacKeane, não o homem idoso que esperava, deitado na cama com o peito envolto em ligaduras, assim como o braço direito e alguns hematomas e feridas no rosto.
- Quem é você?!
Ele olhou-a de alto a baixo e Ellen não gostou da forma como ele a olhou. Engoliu em seco e abriu a boca mas ele continuou.
- Outra?! Mas vocês são de cera?!
- Peço desculpa. Eu...
- Esqueça. - Ele fez-lhe sinal para que se aproxima-se - Mais uma menos uma, total já é a quarta em menos de um mês! Só espero que não seja sensível demais. - Ele encolheu-se - Estas dores acabam comigo. Ajude-me a levantar. Vamos! Espero levantar-me ainda hoje. - Ele voltou a chamar a atenção dela ao ver que não se mexia - Sei que devo ficar na cama e mexer-me o menos possível... - Ele revirou a vista - Torna-se chato repetir tudo cada vez que decidem partir.
Ellen aproximou-se dele e ajudou-o a sentar-se na cama. Arrepiou-se ao sentir a pele dele, o único homem que ela tinha tocado tinha sido Jim. Sentiu a pele quente e as costas rijas debaixo da sua mão, o que a levou a pensar se todo o seu corpo seria assim. Corou ao pensar nisso e tentou concentrar-se em ajudá-lo a colocar-se de pé.
- Se tentasse ser mais compreensivo...
- Mais compreensivo?! Acha que não sou?!
- Não sei.
- Então sugiro que guarde as suas opiniões para si.
Ellen soltou-o e ele caiu na cama gemendo de dor.
- Desculpe! - Ellen voltou a segurá-lo pela cintura - Não pretendia...
- Bolas mulher! Queres matar-me!?
- Claro que não. Foi sem intenção, se me deixasse explicar...
- Não quero ouvir nada. Ajuda-me apenas a sair da cama e podes sair.
- Mas eu tenho de lhe dizer...
- Depois, enquanto jantamos.
- Jantamos?!
- Não vieram entregar a comida?!
- Sim. Está no...
- Óptimo. Gosto de jantar às oito.
- Vou preparar-lhe um tabuleiro. - Ellen desistiu de explicar a situação.
- Dá-me dez minutos.
- Não precisa de ajuda?
- Acho que consigo ir à casa de banho sozinho.
Ele olhou-a fixamente e ela desejou ter um buraco para se meter. Era a segunda vez, num curto espaço de tempo, que se sentia envergonhada. Envergonhada e idiota! Saiu do quarto assim que ele entrou na casa de banho. Enquanto percorria o corredor pensava que tinha de lhe dizer que não era enfermeira. Assim que ele soubesse iria chamar outra enfermeira e tudo se resolveria. Parou ao perceber o que isso significava.
Quando isso acontecesse ela tinha de abandonar a mansão. Não, ela não estava com disposição de enfrentar aquele caminho durante a noite. O melhor era dizer-lhe no dia seguinte. Entretanto, podia aproveitar para descobrir algo sobre o modo como se magoou, e porque estava ali e não num hospital. Isso era o suficiente para começar. Depois bastava completar com o local onde ele estava e com o que as pessoas pensavam dele. Essa noite era mais que suficiente para recolher material para o seu artigo.
Colocou a comida na mesa e esperou ouvir a campainha ou que a chamasse, olhou o relógio. Os dez minutos tinham passado, esperou mais um pouco mas a campainha não se ouvia. Olhou novamente o relógio, fazia vinte minutos que o tinha deixado. Embora relutante foi ao quarto dele e bateu na porta mas não obteve resposta. Voltou a bater enquanto empurrava a porta.
- Sr. MacKeane?! Está bem?! Sr. MacKeane?! - Ellen batia na porta da casa de banho - Está bem?!
Com algum receio abriu a porta, o seu coração começou a bater depressa ao vê-lo estendido no chão. Que fazia?! Ajudava-o a levantar-se?! Ou devia de chamar um médico ou uma ambulância?!
Com alguma dificuldade conseguiu voltá-lo e colocar-lhe uma toalha por debaixo da nuca. Colocou a mão no peito dele, os batimentos pareciam normais. Apenas um suor frio lhe escorria pelo rosto, com algum cuidado, começou a molhá-lo com uma outra toalha.
- Sr. MacKeane?! Está a ouvir-me?!
Ellen ajoelhou-se junto a ele e com a mão afastou-lhe uma madeixa de cabelo da testa. A barba por fazer à algum tempo, ocultava um rosto de traços fortes, o cabelo negro estava um pouco comprido. Talvez devido à situação actual o tivesse mais comprido, não se recordava de ver uma fotografia dele com o cabelo comprido, a pele mostrava um leve bronzeado... Envergonhou-se do rumo dos seus pensamentos.
- Sr. MacKeane?! Está bem?!
- Estava se não me chamasses de sr!
- Desculpe. Pensei que...
- Raios! - Luc fez uma careta de dor ao tentar levantar-se. - Outra vez! Começo a estar farto disto.
- É normal desmaiar?
Ellen ajudou-o a levantar-se e manteve o braço ao redor da cintura dele. Olhou para ele pelo canto do olho, devia de ser frustrante para um homem como ele sentir-se tão vulnerável. Deixou-o apoiado na parede e afastou-se ligeiramente para abria a porta de modo a passarem os dois, mas quando voltou a olhar para ele, viu-o fechar os olhos repentinamente e procurar apoio nos ombros dela.
- Quer que chame alguém?!
- Não! - Luc mantinha os olhos fechados - É para isso que aqui estás.
- Mas eu...
- Ajuda-me a chegar à cama e vai jantar. - Luc interrompeu-a - Eu perdi o apetite.
- Mas...
- Quero ficar sozinho.
Ellen obedeceu sem reclamar. Foi para a cozinha e tentou comer algo. Enquanto comia um pouco de creme de camarão e uma sandes, continuava a ver a imagem dele deitado no chão. Compreendia que para um homem como ele, fosse complicado ver-se naquela situação. Mas ninguém estava livre de situações como a dele. Nem mesmo o frio magnata Luc MacKeane! Olhou para o relógio, apesar de contrariar a ordem dele, tinha de lhe dar a medicação e algo para comer. Preparou uma sandes e um copo com sumo de maça que havia no frigorífico, e dirigiu-se para o quarto dele. Esperava conseguir convencê-lo a comer algo, estava ali à poucas horas, mas já tinha percebido que ele não gostava de ser contrariado.
- Não ouviste quando disse que perdi o apetite?!
- Ouvi. - Ellen falava calmamente - Mas não pode tomar a medicação sem comer.
- Posso e vou fazê-lo!
- Não vai não!
- Quem paga o teu salário sou eu. Por isso...
- Isso não quer dizer que o ajude a matar-se! Por isso vai comer.
Ellen manteve o olhar dele, conseguiu perceber que estava furioso. Mas não se iria render, a atitude dele recordou-lhe a última conversa com Jim, ele também tinha a ideia que era senhor da vida dela só porque lhe pagava o salário! Pestanejou para afastar as lágrimas que ameaçavam aparecer e voltou a fixar o olhar de Luc. Pensou que não ia conseguir convencê-lo, mas pouco depois o olhar de Luc suavizou-se e sorriu ligeiramente.
- Tens razão. - Luc falou calmamente - Desculpa, não pretendia ser indelicado.
- Mas foi.
Ellen colocou o tabuleiro sobre as pernas dele e sentou-se no cadeirão enquanto ele comeu a sandes.
- Já falou ao médico nestes desmaios?
- Sim.
- E encontraram a causa?
- Efeitos secundários do acidente.
- Teve um acidente?!
- Sim.
- Sinto muito.
- Obrigada.
- Precisa de algo mais?!
- Sim.
- Diga.
- Que me chames Luc. Ou também vais fugir ao menor sinal de impaciência da minha parte?
- Quer dizer que ainda consegue ser mais impaciente?!
Luc olhou-a com o sobrolho carregado e depois soltou uma gargalhada. Ellen sorriu para ele antes de regressar à cozinha. Enquanto arrumava a loiça pensava que devia de lhe dizer a verdade, não podia continuar a mentir-lhe, não quando ele podia desmaiar a qualquer momento. Mas se lhe dissesse, ele mandava-a embora e ficava sozinho enquanto não chegasse alguém. E ela não podia deixá-lo sozinho, não pelo seu artigo, mas porque ele não estava em condições de estar só.
E se a enfermeira tinha regressado à clínica, lá veriam que não estava nenhum profissional com ele e enviariam alguém. E quando esse alguém chegasse ,ela deixaria a mansão e regressaria a casa. Mas só aí, até lá permanecia ali junto a ele, ajudando como pudesse.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário