quinta-feira, 21 de setembro de 2017

APÓS O ENTARDECER 10ª PARTE





A madrugada estava a terminar e Mellisa continuava acordada.

A sua cabeça estava povoada de possíveis causas para aquela insónia pois o dia tinha sido cheio de surpresas, e qual delas a mais desconcertante!
Bianca não era mãe de Diana... Joshua não amava Bianca como ela pensava, mas sim a mulher que o destino arrebatara do seu lado precocemente...
O facto de ele lhe ter pedido para ficar...
A descoberta dos seus verdadeiros sentimentos por Joshua...
Talvez fosse isso que lhe retirava o sono! Ou pensar que ia deixar Diana... Ou todas elas juntas!

 Sentindo alguma dificuldade em respirar, levou uma mão ao peito e sentou-se na cama olhando o exterior.  O nó que sentia na garganta desde que chegaram do passeio, parecia mais intenso. Não sabia explicar o que sentia...  Apenas tinha consciência daquela pressão no peito, do enorme desejo em chorar...
Desistindo de dormir começou a ler uma revista que tinha comprado nessa manhã. Talvez assim conseguisse reconciliar o sono e dormir as poucas horas que restavam da madrugada.  Mas a tentativa fora em vão.
Além da ansiedade que sentia, começou a ter raiva dela própria!
Não recordava a última vez que sentira tanta ansiedade. Aquela insónia, a ansiedade... Tudo era próprio de adolescentes, não de mulheres adultas! Sem esquecer que não tinha razão de ser, principalmente porque já tinham partilhado a mesma cama! E por várias vezes! Até Diana parecia mais à vontade que ela com o que havia entre eles!

Sentindo-se ridícula saiu da cama e foi até à cozinha. Ligou a máquina do café e olhou o mar através da janela. Apenas se via o brilho prateado do mar que ondulava docemente, como se este também tivesse adormecido.
Algo naquela tranquilidade aliviou o aperto que sentia e as lágrimas começaram a cair.

- Acordaste cedo.
- Sim... - Mellisa limpou as lágrimas.
- Estás a chorar?! - Joshua aproximou-se dela.
- Não é nada...
- Nada!?
- Estou apenas cansada.
- E choras quando estás cansada?!
- Não dormi e...

Joshua abraçou-a e beijou-lhe as faces. Quando a abraçou não teve forças para se afastar, nem queria. Mas aquele beijo deixara-a desconcertada! Esperava um beijo apaixonado, arrebatador, como todos os que tinham trocado! Não um beijo carinhoso...

- Que fazes?! Pára!- Mellisa protestou quando ele a levantou nos braços.
- Vamos para o quarto. Precisas dormir.
- Joshua! Deixa-me no chão!
- Psiu... Acordas Diana.
- Este não é o meu quarto.
- Não... - Joshua abriu a porta com o pé - É mais fácil vencer as insónias juntos.
- Não podemos...
- Eu não vejo impedimento algum.


Ouviu-se o som da porta a fechar e no instante seguinte Joshua deitou-a na cama. O cheiro dele estava entranhado nos lençóis e inebriou-lhe os sentidos. Mellisa estremeceu quando Joshua se deitou a seu lado, mas ele voltou a beijar-lhe o rosto carinhosamente antes de a aninhar nos seus braços.

- Depois... Temos muito tempo, agora relaxa.

Tempo... Eles tinham muito tempo
O calor do corpo dele envolveu-a num doce torpor  e pouco depois rendia-se ao sono.



O sol batia no rosto de Mellisa obrigando-a a abrir os olhos. Olhou para o braço que repousava na sua cintura.
A julgar pelo peso, Joshua dormia... Voltou-se com cuidado e observou-o.
Dormia serenamente, como se não tivesse qualquer preocupação. Como se a presença dela ali fosse normal... 
Um ruído lá fora chamou a sua atenção e sentou-se repentinamente acordando Joshua com o brusco movimento.


- Aconteceu alguma coisa ?!
- Diana! - Mellisa tentou sair da cama - Já deve estar acordada!
- Acalma-te. - Joshua olhou o relógio - Ainda é cedo.
- Tenho de...
- Casa comigo.


Mellisa olhou para ele sem saber que dizer. De onde saíra aquela pergunta!? Casar! Em escassos minutos tinha sentimentos contraditórios. O seu coração batia de felicidade... Mas a sua cabeça recordava um outro pedido de casamento... Ele tinha feito esse mesmo pedido a Bianca! E não à muito tempo... Ele apenas pretendia uma mãe para Diana. Uma mulher que substituísse a que perdera! A imagem dos tios discutindo misturou-se àqueles pensamentos.

- Aceitas?!
- Não!!! Claro que não!
- Porque não?! - Joshua sentou-se na cama e segurou-lhe a mão - Seria perfeito. Diana adora-te.  Nós gostamos das mesmas coisas. Não temos qualquer problema na cama e se...
- Não digas mais nada! Como podes pedir-me uma coisa dessas!?
- Como!? - Joshua olhou-a seriamente - Acho que é evidente! Tu mesma o disseste...
- O facto de fazermos amor não quer dizer que quero casar contigo! 

Mellisa saiu da cama e ficou a olhá-lo enquanto a sua mente repetia " Porque não me amas!?" " Se ao menos me amasses"

- Tens razão. - Joshua sentou-se na cama de costas para ela - Um casamento não se pode basear em sexo.
- Claro que não! - Mellisa precisou de todas as suas forças para não chorar - Deixavas de discutir com Bianca para discutir comigo!
- Sendo assim, ficas apenas mais um dia...
- Sim...
- Nesse caso vou providenciar o teu regresso. - Joshua parou junto à porta da casa de banho - Quando saíres fecha a porta.


Joshua desapareceu na casa de banho e ela ficou a olhar a porta desejando que ele voltasse a sair dizendo-lhe que a amava. Ao sentir as lágrimas que caíam silenciosamente, saiu do quarto rapidamente e regressou ao dela. Quando entrou deixou-se escorregar pela porta permanecendo encostada a ela soluçando compulsivamente. Temendo que Diana acordasse, e a ouvisse, entrou na casa de banho, onde se entregou à dor que a consumia.

Se ele a amasse tudo seria diferente. Amava-o e amava Diana, mas não conseguiria viver ao lado dele sabendo que não a amava!  Apesar das discussões, pedira Bianca em casamento para dar uma mãe a Diana. O que provava que ele estava disposto a fazer qualquer sacrifício pela filha. Inclusive casar com uma mulher que não amava! Mas ela não seria capaz de viver assim! Na sombra da mulher que ele ainda amava...
Se aceitasse casar, seria uma versão mais nova do casamento dos seus tios! Actualmente não era feliz, mas ficar significava acabar com a pouca paz de espírito que lhe restava. Como pode ponderar em ficar?!



Joshua abriu a porta do carro. A viagem até ali fora feita praticamente em silêncio, apenas Diana falava. Nem mesmo quando a menina se agarrou a ela, ele manifestou qualquer emoção. Mantivera-se frio e ausente. Tal como fizera durante todo o dia.

Desde que se negara a casar com ele, que ele praticamente não lhe dirigia a palavra. Apenas lhe falara a meio da manhã, para lhe dizer que ia sair mas que regressava a tempo de a levar ao aeroporto.


- Tens de ir?!
- Sim linda.- Mellisa abraçou Diana - Infelizmente tenho de ir .
- Porquê!?
- Outros meninos precisam de mim.
- Porque não dizes que ficas comigo?
- Porque não posso...
- Gritaste com ela! - Diana olhou para o pai com os olhos cheios de lágrimas - A culpa é tua!
- Não! - Mellisa sentiu o coração ficar mais apertado - Não tem nada que ver com o teu pai. Simplesmente tenho de regressar ao trabalho. Olha, tenho uma ideia. Porque não vais visitar-me?! Podes ir sempre que quiseres.
- Posso!? - Diana limpou as lágrimas - Podemos ir pai?

As duas olharam para ele aguardando uma resposta.   

- É melhor não. Não queremos incomodar.
- Oh pai...
- Será um prazer voltar a ver-vos.
- Vês!? Deixa lá...
- Muito bem. Qualquer dia. Agora deixa Mellisa, ela tem de subir para o avião.
- Está bem.

Diana abraçou-a e ao sentir os braços pequeninos em redor do seu pescoço, esforçou-se para controlar as lágrimas.

- Não me vais esquecer!?
- Nunca. - Mellisa beijou a pequena sentindo que perdia o controle - Serás sempre a minha princesa.
- Pai! - Diana afastou-se dela - Não te vais despedir de Mell?

Joshua olhou para a filha e depois para ela. Quando o viu cerrar os maxilares pensou que lhe voltasse costas, mas ele estendeu-lhe a mão.

- Faz boa viagem.
- Obrigada.
- Não é assim! Tens de lhe dar um beijo!
- Não!!! - Mellisa respondeu rapidamente.
- Porquê!? - Diana olhava para ela.
- Linda, existem várias formas de nos...

A explicação dela foi interrompida quando ele a agarrou pela cintura apertando o corpo dela contra o dele, ao mesmo tempo que se apoderava da boca dela com urgência. A língua dele brincava com a dela levando-a a sentir um arrepio percorrer-lhe o corpo. Esqueceu-se de tudo e rodeou o pescoço dele atraindo-o para mais perto. Quando o coração dela começou a bater descompassado ele afastou-se.

- Adeus Mell.
- Adeus.

Mellisa ficou no mesmo local observando como ele se afastava com Diana nos braços. As lágrimas caiam copiosamente molhando a t-shirt e por escassos segundos esteve tentada a ir atrás dele. Dizer-lhe que sim, que apesar de ele continuar a amar a sua falecida mulher, ela aceitava casar com ele!
Mas sabia que não seria feliz assim. Era preferível regressar para o seu emprego, para a sua vida e para a sua solidão. Qualquer coisa era melhor que um casamento de mentira. Um casamento onde nunca seria amada.






- Ainda não me contaste como ele é.
- Como se não soubesses.
- Achas que sei tudo...
- Não. Mas aposto que já foste espreitar as fotografias que pedi para apanhares.
- Achas que faria algo semelhante?! Não acredito! Olha que tu...
- Se estou enganada peço desculpa. E como forma de me redimir convido-te para jantar.
- Aceito. - Faty sentou-se no sofá - E quando vamos ver as fotografias?!
- Tu não tens solução... - Mellisa riu - Vou apanhar o álbum.
- A propósito de álbum. No hospital perguntaram por ti.
- Tenho de ir até lá este fim de semana.
- Tens uma bela colecção. - Faty folheava o álbum - Não seria capaz de fazer isto.
- O quê?! Guardar fotografias?
- Recordar todos eles...
- Se escreveres os nomes é fácil.
- Não tens medo de te apegar demais?!
- Nunca damos amor demais. E é uma forma de sentir que sou importante para alguém. Que alguém me ama...
- Ei! Eu amo-te! - Faty colocou as mãos na cintura - Pensei que soubesses. És a irmã que nunca tive.
- Obrigada. Tu percebeste.
- Sim, mas não adianta pensares nisso. Porque não te agarraste a ele? - Faty agarrou um fotografia de Joshua - É um homem e tanto...
- Sim...
- Se amasse um homem como tu o amas, e não me desmintas que não vale a pena, não o teria largado.
- É assim tão evidente?
- Não se nota nada! - Faty ironizou.
- Grande amiga...
- Sou sim! Caso contrário estaria num avião a caminho do Brasil para o conquistar.
- Terias muito trabalho pela frente. E não sei se conseguirias.
- Tudo se conquista nesta vida.
- Nem tudo. Quando perdemos o nosso verdadeiro amor apenas restam os substitutos, os que acalmam as saudades daqueles que não podemos ter.
- Não entendi.
- Esquece...




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